domingo, 6 de dezembro de 2020

SP - Passarinhando durante a pandemia - Capítulo IV - Iporanga e Eldorado

Eu ando um pouco sem inspiração para escrever e contar algumas das aventuras vividas durante esta pandemia. Acho que essa segunda onda que chegou foi onde “caiu a ficha” e a tristeza bateu à minha porta. Estou relutando pra que ela não entre. O confinamento só não é pior que a própria doença. Amigos e familiares sendo contaminados, pessoas perdendo entes queridos. Está ficando difícil manter o sorriso no rosto e os pensamentos positivos e esperançosos diante de um quadro tão escabroso assim. 
  
O mundo não está tão cor-de-rosa como antes e chora pelos elos perdidos
Foto by Silvia Linhares

Meu organismo vem se rebelando e eu tenho feito tudo que posso para que ele mantenha o equilíbrio que sempre foi meu orgulho. Enfim, distrações não faltam aqui em casa, e confesso, tem muita coisa pra fazer, o que falta mesmo é ânimo. Se não fosse o apoio e carinho que recebo dos amigos virtuais e de algumas pessoas próximas a mim, acho que seria muito pior.

Ao som de Stairway To Heaven da antiga e insubstituível banda Led Zeppelin, a inspiração que eu necessitava bateu em retorno e, enquanto "banqueteio" os ouvidos, as palavras começam a ser desenhadas na minha mente.

“...In the tree by the brook / There's a songbird who sings / Sometimes all of our thoughts are misgiven / It makes me wonder..."

“... Numa árvore perto do riacho / Há um pássaro que canta / Às vezes, todos os nossos pensamentos estão equivocados / Isso me faz pensar ..."


 
Led Zeppelin - Stairway To Heaven

Vamos voltar no tempo um pouquinho. Setembro é o mês que começa a primavera. Um dos meus meses preferidos. As flores começam a desabrochar. Os passarinhos ficam mais felizes. A natureza começa a nos brindar com cenas, cores e momentos que vão marcar para sempre nossa memória.

Esse ano, apesar da pandemia, tão nefasta, e de muitos lugares estarem fechados para visitação neste período, aos poucos, com todos os cuidados possíveis, eu acabei indo a um lugar que não batia os olhos há algum tempo. Fui ao Vale do Ribeira (Baixo Ribeira - municípios de Eldorado e Iporanga). 

O Vale do Ribeira é uma região localizada no sul do estado de São Paulo. Compõe-se de 25 municípios. Abriga 61 por cento da mata atlântica remanescente no Brasil, 150.000 hectares de restinga e 17.000 hectares de manguezais. É onde fica o PETAR - Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira, que se localiza entre os municípios de Apiaí, Eldorado e Iporanga. Este Parque possui uma das maiores extensões preservadas de Mata Atlântica original, além de ter uma das maiores concentrações de cavernas do planeta. Suas montanhas, vales, cachoeiras, rios de águas cristalinas, cavernas, fauna e flora exuberantes tornaram o parque um ponto muito importante para o ecoturismo brasileiro. (Wikipedia)

(http://www.biotaneotropica.org.br)

E para os aficionados por aves como eu, é onde se concentra o maior número de rapinantes do Estado de São Paulo, entre outras preciosidades. Conta com dois dos melhores guias que que temos no Estado: Carlos Roberto Duco e seu fiel escudeiro Maicon Birdwatching. Eu estive no Petar e região a primeira vez em 2012, com amigos do CEO - Centro de Estudos Ornitológicos, onde fui guiada pelo amigo Junior Petar. Depois em 2013 retornei sob o comando do grande guia e amigo Adrian Rupp. 

Somente fui voltar na região este ano no começo de setembro, a convite do meu querido amigo Marco Cruz. Fomos guiados pelo Duco, agora um grande amigo também. Eu sempre acompanhei o trabalho do Duco e do Maicon pelas redes sociais. “Discípulos” do querido Junior Petar, os dois vem se dedicando com muito amor à profissão e carinho às aves. Eu fiquei muito feliz com o convite, onde pude apreciar o trabalho deles in loco. Não vejo a hora de voltar agora que o Parque reabriu. 

Mas vamos lá contar como foi essa rápida aventura pelo Baixo Ribeira.

05 de Setembro de 2020 - Sábado

Finzinho do inverno, com prenúncios primaveris, véspera de feriado, num sábado ensolarado, assim que o Marco chegou em São Paulo, partimos para Eldorado, onde reside o nosso amigo Duco, cidade vizinha de Iporanga. 

Até sairmos de São Paulo e chegar lá foi uma maratona. Eldorado fica a pouco mais de 230 km da minha casa, mas quando se trata da Rod. Régis Bittencourt a equação km x tempo nunca bate. Esta é, na minha visão, uma das rodovias mais complicadas e chatas por aqui. Passamos quase o dia todo na estrada, chegamos lá só no final da tarde. Falando assim parece que demorou toda vida, mas ouvindo música e proseando, a gente nem percebe. 

Eu queria ficar hospedada no Glamping Mangarito, do amigo Junior, ou na Pousada da Diva (mãe do Junior) mas ambas ainda não estavam recebendo quando do meu contato. 

Acabamos nos hospedando na deliciosa Pousada Ecológica Recanto das Águas, em Eldorado, lugar indicado pelo Duco, com vários chalés, um lago e muita mata em volta. O lugar por si só já teria valido a ida. 

O funcionamento ainda era precário na ápoca e o dono nos explicou as dificuldades que vinha enfrentando desde o início da pandemia. Após um lanchinho e uma cerveja geladinha, fomos dormir, pois o dia seguinte prometia altas emoções. 

Marco e eu na Pousada

06 de Setembro de 2020 - Domingo 

Acordamos bem cedo e fomos direto para a casa do Duco. Fomos recebidos com um delicioso café da manhã, preparados pela Daiane, esposa do Duco, uma vez, que por causa do contingenciamento, a Pousada não estava servindo café da manhã. 


Seguimos para as cercanias do Petar, já que este ainda não estava aberto aos visitantes. Mesmo assim, foi um festival de fotos e bichos legais. 

De cara pude fazer um baita melhoraifer: caburé-miudinho (Glaucidium minutissimum). Depois fizemos o araçari-banana (Pteroglossus bailloni), fotos lindíssimas do macuru-de-barriga-castanha (Notharchus swainsoni) e do olho-falso (Hemitriccus diops). Não consegui fotão do gavião-pombo-grande (Pseudastur polionotus) nem da maria-pequena (Phylloscartes sylviolus). Foram apenas  registros, porque os dois não colaboraram. Ficou para uma próxima. 

Mas sabe aquele bico-assovelado (Ramphocaenus melanurus) no limpo, na altura dos olhos, que o exibido do Duco posta por aí? Lenda, viu gente, aquilo "non exciste". É pura montagem no Photoshop. Kkkkkkkk (brincadeirinha, o bicho é de época, como explicou o Duco).

Duco, Marco e eu

Eu e Marco by Duco

As aves do dia

A vegetação da Mata Atlântica é riquíssima e deixa os olhos deslumbrados diante de tanta exuberância. E no meio de mais de cinquenta tons de verde, para Robert Ridgway nenhum botar defeito (ref. Nomenclature of Colors for Naturalists), meus olhos, sempre atentos, acabavam vislumbrando uma corzinha ali, outra acolá, fosse de um frutinho silvestre, uma pequena flor ou uma borboleta. Passarinhos eu esperava o Duco apontar.

Verde que te quero sempre ver-te

Uma pose para guardar de lembrança

Cores do Vale nesse setembro 2020 (fotos by Silvia Linhares)

Um temporal se aproximava e resolvemos não arriscar. O tempo muda muito rápido no Vale. De um dia sem uma nuvem, de repente fecha tudo e chove. E vice-versa. Então começamos a fazer nosso caminho de volta.


Durante o retorno, passamos num ponto onde o sabiá-pimenta (Carpornis melanocephala) costuma dar mole, e deu. Como é lindo esse bichinho! Olha só o olhinho vermelho como se destaca. 


Mas o melhor não foi isso. De repente outro carro parou e duas pessoas desceram. Era o Maicon com um cliente, que queria me conhecer pessoalmente. Desde então o amigo virtual Paulo Serafim se tornou um amigo real, e eu ainda espero que a gente se encontre outras vezes para passarinhar, fora dessa pandemia.

Eu, Duco, Paulo Serafim e Maicon (foto by Marco Cruz)

No final da tarde voltamos para a Pousada onde pudemos conhecer um pouquinho melhor os arredores com o restinho de luz que havia. O duro foi o celular sem bateria, o que me impediu de fazer umas fotinhas do local.

07 de Setembro de 2020 – Segunda-feira

Acordamos cedo e fomos em busca do macuru (Nonnula rubecula), que era um dos "targets" do Marco. O Duco foi certeiro, levando a gente diretinho ao ponto, num lugar próximo. O bichinho deu show. O Marco queria uma foto mais top ainda e subiu na amurada, e eu, que morro de medo de altura, pedi pro Duco segurar ele pelas calças. Apesar do meu medo, foi engraçado de ver e eu não pude deixar de registrar.

Ai ai ai ai, será que está seguro assim?

E ainda ficou se exibindo porque sabe que eu me pelo de medo kkkkkk

Eu, Duco e Marco

Atenção galera: 1,2,3,4,5 - self timer final

Demos um pulinho numa matinha próxima da casa do Duco, onde costuma ter leque de rendeira (Manacus manacus). Só não foi a fotos dos sonhos, porque a tarde estava escura devido às nuvens e a pouca luz dificultou um pouco a fotometria perfeita. Mas o espetáculo que os machos deram para atrair as fêmeas já valeu a ida.

Havia muita neblina, o tempo não estava firme. E como eu não queria pegar estrada ao anoitecer, decidimos almoçar em Eldorado e retornar após um descanso. 

Fiz a "siesta" vendo os bichinhos nos bebedouros e comedouros da casa do Duco (aguardando sua pousada com ansiedade, viu, Duco).

Destaque para o beija-flor-de-veste-preta (Anthracothorax nigricollis), topetinho-verde (Lophornis chalybeus) e corruíra (Troglodytes musculus). Eu fiquei mais apreciando o vai e vem dos bichinhos do que clicando.

Aves do dia

Depois pegamos a estrada de volta, e pra minha sorte, o Marco é um excelente piloto e dirige meu carro com muito cuidado, embora fique fazendo careta o tempo todo quando reclamo de alguma coisa. kkkk E ainda me chama de "cabeção" ... pode isso, gente? 


Só que a volta não foi nada rapidinha, (volta em pleno feriado nunca é rapidinha), principalmente quando se tem algum imprevisto no caminho. Um acidente na altura da cidade de Registro nos deixou quase três horas parados. E como não podia ser diferente, a Serra do Cafezal estava lotada, deixando a chegada até São Paulo caótica. Mesmo assim, parecia que o caminho tinha diminuído, ou será que foi a minha ansiedade que diminuiu? kkkkkk 

Enfim, esta foi uma passarinhada bem leve, daquelas necessárias pra manter a sanidade em tempos de pandemia. Obrigada Marco e Duco por esses dois dias e meio, tranquilos, cheio de passarinhos, paisagens bonitas e muitas risadas. Eu, realmente, não vejo a hora de voltar.

*
*
🚫 All rights reserved. Do not use images without authorization




Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigada por visitar meu Bloguinho!