terça-feira, 18 de agosto de 2020

SP - Passarinhando durante a pandemia - Capítulo II - Dois passarinheiros e diversos destinos

Uma viagem do outro mundo! Ops! Nãooooo! Apenas uma viagem com o amigo Raimundo. Foi assim que comecei a descrever a "tour" para ver passarinhos paulistas que eu e meu amigo Raimundo Carvalho, de Paraupebas/PA, fizemos recentemente. Uma passarinhada descompromissada, improvisada, mas intensa, cheia de emoções, de risos, companheirismo e amizade, que ficará para sempre marcada na minha história. 

Primeiro que aconteceu no meio de uma pandemia. E segundo porque eu nunca acreditei que ele realmente viria. Só ressaltando que eu vivia fazendo "ornitobullying" com ele, mostrando alguns dos seus lifers (aves nunca registradas por ele) que apareciam na minha janela, tipo o sabiá-laranjeira e o periquito-rico. Acredite, muita gente ainda nunca viu essas duas espécies, super comuns para a gente aqui em Sampa City.

Sabiá e Periquito na frente da janela de um dos quartos aqui de casa

E olha, eu nunca havia dirigido tanto em tão pouco tempo, nem ido a tantos lugares aqui perto de uma vez só. Mas quer saber se valeu a pena? Então continue lendo.

Em janeiro deste ano, quando eu contei pra ele uma ida com minha amiga Leila ao Seu Jonas em Ubatuba e mostrei as fotos, ele me disse brincando "Ubatuba nos aguarde, não há lugar melhor do que São Paulo para um passarinheiro como eu". Ele planejava ir ao Peru em suas próximas férias, mas não tinha dado certo. Aí ele me confessou que sonhava passarinhar em São Paulo. Disse que se pudesse vir seria a salvação de suas férias. Eu disse, então venha, uai! Na época, eu prometi pra ele que, caso ele viesse, ele teria a melhor companhia, a melhor motorista, iria aos melhores lugares e contaria com os melhores guias. É o que costumo fazer quando recebo meus amigos por aqui durante o pré ou pós Avistar Brasil.

No final de fevereiro ele estava confirmando suas férias para agosto e disse que gostaria muito de vir à São Paulo. Mal processei as mensagens dele em relação a isso, pois eu só tinha cabeça pra uma coisa: a viagem dos meus sonhos. Eu me preparava para ir para a África. Viagem que foi mesmo dos sonhos (leia como foi clicando aqui).


Poucos dias depois que cheguei da África (13/03), o mundo recebeu a pior notícia de todas. ESTAMOS EM PANDEMIA. FIQUEM EM CASA. Lembro do Raimundo ter me dito: "O coronavírus está parando o Planeta. Vivemos momentos de muitas incertezas." Eu respondi que estava trancafiada em casa e que em breve ele poderia vir me visitar em um manicômio, porque eu estava começando a ficar maluca.

Em julho, após chegar no meu limite de sanidade e antes que eu virasse homicida, por insistência do meu amigo Marco Cruz, fiz minha primeira passarinhada pós início da pandemia. Pouco depois fui com as amigas Leila e Viviane até Peruíbe onde até fiz um lifer há muito desejado. Veja aqui

O Raimundo então me contou que fechara com o meu amigo e guia Victor do Nascimento, o Vitinho, uma passarinhada no Mato Grosso do Sul para as férias dele. E, pasme, não me convidou para ir com ele. Eu brinquei que dava azar passarinhar sem mim. Ele disse que ficaria algumas horas no aeroporto em conexão na volta e aproveitaria para devolver meus cartões SD (que, juro, eu nem lembrava que tinha emprestado pra ele). 😅😂😅😂😅😂

Alguns dias depois de confirmada sua ida para o MS, ele estava tentando mudar seu retorno para fazer um day-use na Trilha dos Tucanos no dia 14/08 e disse que iria aproveitar para devolver os meus cartões. Naquele momento eu estava quase fechando uma saída pelágica para o dia 14 em Ilhabela. Tudo indicava que haveria um grande desencontro entre a gente.

No dia 22/07 ele me contou que havia possibilidade de cancelamento da ida dele para o MS, e dessa forma, talvez não conseguisse devolver meus cartões. Falei que se ele quisesse vir para São Paulo, eu poderia tentar ver com meus amigos alguns lugares para ele passarinhar. As coisas por aqui ainda estavam bastantes complicadas, muitos lugares fechados, quase ninguém recebendo. 

Aí, no dia 31/07, o Raimundo me informa que seu voo para o MS fora cancelado e por esse motivo ele cancelara tudo. Ele estava bem chateado. Aí falei se ele não queria mesmo vir pra São Paulo, uma vez que a minha saída pelágica tinha sido adiada por falta de quórum. Eu disse que poderia levar ele para os lugares que estivessem disponíveis. Então ele manteve sua reserva na Trilha dos Tucanos e me convidou para acompanhá-lo. Também me deu autonomia para decidir os lugares que iríamos. No mesmo instante conseguiu voos para SP. Chegaria no dia 03/08. 

Para mim foi um "se vira nos 30". Logo eu que sou acostumada a planejar tudo com calma. Pedi sua lista de aves do Estado de São Paulo e com base nela e na minha experiência, comecei a contatar os amigos e a idealizar um roteiro que possibilitasse a ele conhecer o maior número de aves. Com a notícia em cima da hora, a maioria dos lugares que eu gostava de ir e que estavam funcionando dentro de rígidas normas de segurança, estavam praticamente lotados. 

Mas a sorte me sorriu. Poucos dias antes eu conversara com dois amigos e grandes guias (Thiago Carneiro e Cal Martins). Tinha inclusive aventado a possibilidade deles me guiarem, uma vez que, em agosto, estariam, aos poucos, retornando às atividades. Conseguimos compatibilizar agendas e datas para o período da estadia do Raimundo por aqui.

Em menos de duas horas, eu consegui traçar um plano estratégico, com uma logística viável e me preparei para uma jornada que eu sabia que seria puxada, mas que tinha tudo pra ser muito legal. Essa jornada iniciou dia 03/08 e terminou no dia 16/08. Do início ao fim rodamos 2.264 km. 

Painel do meu carro assim que deixei meu amigo no aeroporto

Vou fazer um aparte aqui. Quando estive em sua cidade (Parauapebas/PA), pude contar com sua gentileza em me receber e me acompanhar por lá junto com o grande guia e amigo Filho Manfredini. Se quiser saber como foi essa viagem clique aqui

*03 e 04 de agosto 2020 - segunda e terça-feira*

Raimundo chegou no *Dia 03* à noite. Fui buscá-lo no Aeroporto GRU. Na terça-feira, *Dia 04* aproveitei para leva-lo conhecer os arredores de onde eu moro. Andamos pela avenida Paulista, apresentei a ele os principais edifícios da região, como o MASP, FIESP, CYK (Edifício Comendador Yerchanik Kissajikian) usado nas tomadas externas da novela Belíssima. Pena que o Parque Trianon estava fechado na época. Ele teria feito os primeiros lifers ali. Enfim, tiramos o dia para bater papo e preparar as tralhas para a grande jornada que nos aguardava. 

Raimundo experimentando o presente que eu dei a ele para passarinhar

O MASP ao fundo 

A FIESP ao fundo

*05 de agosto 2020 - quarta-feira*

Saímos muito cedo em direção à Campos do Jordão. São aproximadamente 180 km. O Thiago Carneiro nos indicou pernoitar na Pousada Recanto Ninho Verde, um lugar muito legal e pertinho da casa dele. Eu gostei muito. Adoro Campos do Jordão, ou simplesmente Campos. O clima serrano, a deliciosa comidinha do restaurante Caçarola, da Carol, as lindas aves, paisagens e vegetação, tudo é sempre muito encantador. Eu me sinto em outro país. É por isso que Campos é um dos meus destinos preferidos aqui na região.

Quando vou à Campos o que mais me marca é o carinho que sou recebida pelo meu amigo Thiago Carneiro e sua esposa Juliana. Eu me sinto em casa e o melhor é que sempre tem um café me aguardando na cozinha. Agora tá grande a fila pra quem vai amadrinhar a Lis, filhinha deles que nasceu recentemente, porém já me intitulei madrinha de coração.

Eu e Juliana após o cafezinho,
ao fundo o Raimundo se acabando nos comedouros do Thiago


Thiago nos levou aos lugares mais lindos pra ver passarinhos. Para mim nenhuma novidade, exceto que meus olhos jamais enjoam, principalmente quando as cerejeiras estão floridas. Ver as aves em seu habitat, me faz vislumbrar luz no futuro da humanidade. O colorido dos passarinhos e as amizades que faço em torno deles é o que torna meus pensamentos menos sombrios e mais esperançosos. 

Avistar a Pedra do Baú lá no fundão é um deleite para os olhos. Respirar ar puro então, melhor coisa do mundo. 


Thiago, Raimundo e eu

Agora ver passarinho de tudo quanto é cor, isso não tem preço mesmo. O dedo ficou até doendo de tanto clique. Destaque para o exuberante beija-flor-de-topete-verde (Stephanoxis lalandi), para o delicado caneleiro (Pachyramphus castaneus), o difícil taperuçu-de-coleira-falha (Streptoprocne biscutata), a colorida saíra-lagarta (Tangara desmaresti) e o azul de doer os olhos do sanhaço-frade (Stephanophorus diadematus) dentre muitos outros. Nossos cartões ficaram cheios e a listinha dos lifers conquistados pelo meu amigo Raimundo não parava de crescer.


Aí você quer fazer fotos dos dois amigos e pede pra eles fazerem pose, espia só o resultado. Eu mereço, né? 


Assistir o por do sol, e logo em seguida parar numa estradinha, acender o fogareiro, passar um cafezinho na hora e assar pinhão, não tem coisa melhor no mundo. Thiago, você é f _  _ a! Esse foi para mim um dos momentos mais gostosos do dia. 
 


O frio estava cortando a pele e os ossos doíam de chorar (à noite chegava a fazer -3° e de manhã -1). Nesse dia, à noite, eu preferi ficar no aconchegante chalé a ir atrás de aves noturnas. Deixei isso a cargo dos meninos. Assim que o Raimundo chegou, pedimos o jantar por delivery (por sugestão do pessoal do hotel), uma vez que estava tudo fechado à noite. Foi comida pra dois dias.


*06 de agosto 2020 - quinta-feira* 

Em que pese a temperatura estar abaixo de zero e a vontade de ficar embaixo das cobertas quentinhas ser enorme, saímos cedinho para procurar os papagaios-de-peito-roxo (Amazona vinacea) e o caneleirinho-de-chapéu-preto (Piprites pileata) - duas aves ameaçadas de extinção. Ponto certeiro. Espetáculo garantido. Outra que deu show foi a linda e elegante gralha-picaça (Cyanocorax chrysops). 



Raimundo fez muitos lifers e eu um monte de fotos bonitas. Depois rodamos atrás das cerejeiras floridas, o que sempre maravilha meus olhos e me enche de paz. Percorremos vários lugares em busca dos lifers do Raimundo. As aves não decepcionaram. Foi uma mais bonita que a outra. 


A foto do tapaculo-preto (Scytalopus speluncae) que ele fez é digna de capa da espécie no Wikiaves.

Foto by Raimundo Carvalho

A cada momento uma paisagem diferente da bela cidade se descortinava na frente dos nossos olhos. 

Eu by Thiago Carneiro


A foto que o Raimundo fez minha com as cerejeiras ao fundo hoje ocupa a foto de perfil nas redes sociais. Olha só minha carinha de felicidade.

Eu by Raimundo Carvalho

Mas quando se tratava de foto do grupo, não tinha jeito - a farra estava garantida. O Thiago parecia um moleque traquina, e o Raimundo não ficava atrás.

Olha só as poses dos caras! kkkkkk

Novamente tivemos um dia de muita alegrias, muitas brincadeiras e muitas gargalhadas. 

- Ei, junta os dois pra foto aí em cima.

- Tá bom assim? (Foto by Raimundo Carvalho)

- Agora sim. 

- Agora é minha vez! (Foto by Raimundo Carvalho) 

Olho por olho ... lente por lente .... kkkkkkkk

Mas o mais legal de tudo isso é contar com o bom humor do Thiago, sempre contagiante. Brincalhão e "zueiro", não deixava passar uma. Fui eleita a bruxinha da turma, isso por enfeitiçar o tempo e as aves ao meu redor. Mas quem voou na minha vassoura foi o Thiago. Juro que não tem montagem. Eu acho que fui a única que pegou um Carneiro voando, e ainda por cima, no limpo, sem galhinho na frente... 😅😂😅😂😅😂 ...

Carneiro voando no limpo, sem galhinho na frente 

Com um por do sol de tirar o chapéu e um visual de parar e agradecer cada minuto vivido, encerramos a nossa passarinhada em Campos. Infelizmente, o guia Marcelo, de Taubaté, não tinha agenda e eu não tive como levar o Raimundo para ver a papa-taoca-do-sul em Monteiro Lobato. Uma pena.


*07 de agosto 2020 - sexta-feira*

Neste dia, a gente ia direto para Dourado/SP encontrar o amigo e guia Cal Martins (que estava guiando em Uberaba e chegaria lá no fim da tarde). No entanto, por motivos de força maior, tivemos que retornar à São Paulo. 

Despedindo de Campos do Jordão

Saímos bem cedinho de Campos do Jordão e quando passamos por Tremembé, o Raimundo pediu que eu desse uma paradinha no arrozal na beira da pista (não, não era o famoso arrozal do Marcão Crozariol). Embora a gente soubesse que seria uma paradinha meia sonsa, por não ser época de avistar aves legais, conseguimos fazer algumas fotinhas bacanas. Ele ainda fez um lifer: a andorinha-morena (Alopochelidon fucata). 

Além da andorinha-morena (Alopochelidon fucata), eu ainda fotografei a andorinha-grande (Progne chalybea), caminheiro-zumbidor (Anthus lutescens) e gavião-caboclo (Buteogallus meridionalis).


Era para ser uma paradinha de 15 minutos, mas demoramos mais de uma hora no local, o que nos fez seguir para Dourado somente após o almoço. Em Sampa City, resolvemos o que tinha pra ser resolvido e partimos. O bom é que deu pra aliviar o peso e o volume das malas, dispensando parte das roupas de frio. São quase 300 km até Dourado, mas pela Rod. Bandeirantes fica muito tranquilo. 

Ao chegar lá, ainda saímos com o Cal Martins procurar corujas e bacuraus. Só tinha um bacurau comum pelo caminho. A surpresa boa foi avistar uma raposinha-do-campo (Lycalopex vetulus), pena que ao tirar minha lente fora do carro, ela condensou com o frio externo e a chance de fazer uma boa foto do bichinho foi por terra abaixo, ou melhor, por água dentro.



*08 de agosto 2020 - sábado*

Saímos bem cedo para o mato. De cara o Cal mostrou dois belos lifers para o Raimundo: tesoura-do-brejo (Gubernetes yetapa) e pula-pula-de-sobrancelha (Myiothlypis leucophrys). Assistir as Gubernetes é um momento muito especial. Elas são mesmo muito lindas. Bailarinas impecáveis. Posso ter visto seu balé inúmeras vezes, mas certeza que nunca vou enjoar. 

Raimundo, Cal e eu


Embora no momento meu amigo tenha parado de postar seus lifers, eu me lembro bem dele fazer uma lista enorme de tudo que era novidade. 

Em outro ponto encontramos mais um monte de bichinho bacana, inclusive uma linda e elegante seriema (Cariama cristata). Em outro ponto adiante, avistamos um lindo príncipe (Pyrocephalus rubinus), encantado pra quem gosta de aves, mas longe de ser o de conto de fadas 😅😅😅😅😅. Mas o melhor é que ele estava na florzinha. 

Raimundo clicando a seriema ao fundo


Cal e Raimundo 

Os dois combinaram de corujar à noite, no entanto, eu me comprometera a participar de uma live (ou webinar) com os amigos do Avistar Brasil a partir das 20 horas. Com isso eu fiquei na pousada e só soube do resultado da saída deles assim que o Raimundo retornou. 

A live foi um momento incrível. Poder estar em contato com tantos amigos só fez bater uma baita saudade de todos. Relembrar cada pessoa ali presente mexeu com meu coração e imaginário, me fazendo voltar no tempo, quando conheci cada um deles. Foram duas horas de bate-papo via rede super delicioso. Querido leitor desse blog, caso se interesse em assistir, segue o vídeo. A abertura é linda. Eu começo a falar no 45° minuto.


*09 de agosto 2020 - domingo*

Domingo amanheceu um dia super lindo. E lá fomos nós percorrer mais alguns lugares da região em busca de aves para o Raimundo registrar. Foi um festival de bichinhos legais, para mim relativamente comuns, mas que sempre dá para melhorar a foto. Destaque para o formigueiro-de-barriga-preta (Formicivora melanogaster), caneleiro-verde (Pachyramphus viridis), miudinho (Myiornis auricularis), maria-ferrugem (Casiornis rufus), tiririzinho-do-mato (Hemitriccus orbitatus) e tachuri-campainha (Hemitriccus nidipendulus)


Um belo amanhecer

Algumas aves muito fofas...

Andando no meio do capim...

Ao chegarmos num ponto, já em Brotas, Cal e Raimundo atravessaram um córrego em busca do barbudo-rajado (Malacoptila striata) e eu fiquei quietinha acompanhando do lado de cá. Um garrinchão-de-barriga-vermelha (Cantorchilus leucotis) forrageava e consegui fazer fotos bem bacanas desse bichinho rebelde.

*10 de agosto 2020 - segunda-feira*

No dia 10 nós fomos para Itirapina. Adoro o lugar aonde a gente passarinha. E só posso agradecer aos proprietários por nos permitir circular por um lugar tão especial. 

Amanhecer de ficar em lágrimas

É sempre um espetáculo rever o cerrado, suas flores e suas aves. Local onde eu já tive grandes emoções e já cliquei aves espetaculares e raras. Cal conhece tudo, cada cantinho, cada bichinho.




Eu by Raimundo Carvalho

Raimundo, eu e Cal

Não estava tão bom de avistamento como estou acostumada. A estrela do local deu as caras, mas por não ser uma boa época, "o senhor" galito (Alectrurus tricolor) não nos permitiu fazer boas fotos como esperávamos. Na primavera ele costuma colaborar bem mais. Mas estava valendo fotografar de um tudo, até carcará e pardal.


Meu amigo Raimundo encontrou uma pena no caminho e me deu de presente. Hoje ela enfeita meu escritório, mas naquele dia enquanto eles foram percorrer uma trilha, ela enfeitava meu cabelo. Eu fiquei admirando e fazendo "selfie". Nada como não ter nada pra fazer. 😅😅😅😅😅

Pena que o fazendeiro, diante da seca que vem assolando nosso Estado, soltou o gado no brejo do seu sítio, destruindo parte do habitat onde moram as sanãs mais tops que o Cal costumava mostrar. Quem sabe numa próxima né, Raimundo?

Dourado é sempre um dos lugares que me traz paz e luz. Gosto muito de lá e das pessoas, principalmente dos pais do Cal, seu Jone e d. Lucinha, que sempre fazem questão de preparar um cafezinho pra mim, antes de eu pegar estrada de volta, mas isso só depois de jogar um bocado de conversa fora.

Enfim, meu amigo Raimundo fez muitos lifers, não só de aves, mas de pessoas, e pessoas maravilhosas, que eu gosto muito. Ver a carinha dele feliz me fez ficar feliz também. Eu tinha certeza que minhas escolhas tinham sido acertadas (ou quase, né Raimundo?). Nem vou contar do seu desapontamento e da bronca que levei por não ter incluído o Tanquã no roteiro. Pelo menos assim você tem motivo pra retornar.

*11 de agosto 2020 - terça-feira*

Após dormir em São Paulo, saímos bem cedinho para passar o dia no Sítio Espinheiro Negro, em Miracatu, que fica a 85 km daqui de casa. Por conta da Jo Bernardes ainda não estar preparada para oferecer pernoite, no final da tarde a gente ia seguir para Peruíbe e dormir no Mochileiros Hostel e Observação de Aves, dos amigo Fábio Barata e Elen. 

Seriam mais 92 km de estradas perigosas e desconhecidas para mim. Lembro de me gelar todinha só de pensar em subir a estradinha do Guaraú à noite. Enfim, desafios e medos estão aí para serem superados. E eu sabia que a qualquer momento podia contar com o meu amigo pra dirigir caso o medo me paralisasse. Só que não. Sempre surgem flores no caminho pra alegrar nosso dia e aliviar nossos temores. 



Mas vamos falar um pouco como foi o dia. Poder sentar em frente aos comedouros da Jo Bernardes no Espinheiro Negro Miracatu/Juquitiba é um bálsamo para o coração e para os olhos. Eu chamo aquilo de o "incrível mundo colorido dos saís e saíras da Jo Bernardes". Fotografar em comedouros me permite ver detalhes das aves que eu dificilmente teria oportunidade de ver dentro mata. 




Não tenho palavras suficientes para descrever o brilho que sai do coração dessa moça. Entre seus inúmeros predicados está seu talento para cozinhar. Após o almoço, o meu amigo Raimundo saiu passear pelas trilhas e eu preferi ficar olhando e fotografando os comedouros e batendo papo com a querida Jo Bernardes. 

Assim que ele retornou, seguimos para Peruíbe como previsto. Passava das 16 horas quando saímos e a previsão de chegar ainda com luz tinha ido por água abaixo. Inverno e serra fazem a noite chegar bem mais cedo do que o normal.

Chegamos em Peruíbe e fomos recebidos com todo o carinho pelo casal Fábio Barata e Elen. Após nos instalamos, pedimos pizza, comemos e logo em seguida eu desmaiei de sono, de tão esgotada que estava.

O cansaço já havia se instalado na minha cabeça e corpo. Minhas olheiras e cabelos estavam de trincar qualquer espelho. Selfie nessa hora, nem pensar. Ainda bem que eu não estava guiando o crush, porque se não ele, certamente, iria sair correndo e me largaria na mão. 😅😂😅😂😅😂

*12 de agosto 2020 - quarta-feira*

Acordamos muito cedo nesse dia, a sorte foi que o Fabio poderia nos guiar, um dos motivos por que antecipei o day-use que estava programado com a Jo para o dia 12.

Trafegamos por mais ou menos uma hora até Itanhaém, tudo para poder ver os papagaios-de-cara-roxa (Amazona brasiliensis), espécie vulnerável e extremamente ameaçada de extinção. Dito e feito. Lá estava um bando deles. Pena que a luz estava péssima. Vimos mais um monte de bichinhos bem legais, que estavam ao redor, como o Tucano-de-bico-preto (Ramphastos vitellinus), gavião-pombo-pequeno (Buteogallus lacernulatus), piolhinho (Phyllomyias fasciatus), tiê-galo (Lanio cristatus), dentre outros.



Antes de ir embora eu ainda fotografei um boi com o chifre só. Ele seguia a gente por todos os lugares. Acho que se apaixonou por mim, porque ele me olhava de um jeito, que nem te conto. 😅😅😅😅😅


Missão cumprida em Itanhaém, o Fábio nos levou ver a bendita saracura-do-mangue (Aramides mangle). Aquela mesma que eu passei anos à cata dela Brasil afora. Agora que já fiz a danada um mês antes nesse mesmo ponto, ela quase vem comer na minha mão. Mal deu tempo do Raimundo montar o tripé e a câmera e ela já estava xeretando a gente 😅😂😅😂😅😂. 

Depois seguimos para a passarela da balsa onde a figuinha-do-mangue (Conirostrum bicolor) não decepcionou. Ainda fiz boas fotos do tiê-sangue (Ramphocelus bresilius), que eu adoro e da sempre linda mariquita (Setophaga pitiayumi).


Nós demos umas voltinhas pela praia. Não vimos quase nada de aves, mas foi divertido aguardar uma única gaivota passar desfilando pela areia toda pomposa. O mais engraçado era o povo olhar pra gente como se fôssemos alienígenas. No mínimo uns alienados 😅😂😅😂😅😂

Lente por lente...olho por olho...

Distanciamento social

- Posso sair na sua selfie?

Que difícil juntar todo mundo kkkk

- Boralá curtir uma praia? ... tô prontinho... 😅😂😅😂😅😂

*13 de agosto 2020 - quinta-feira*

No dia seguinte, resolvemos ficar no comedouro da pousada, sentadinhos apreciando o ir e vir dos bichos. Era um atrás do outro e haja bananas. Na parte da tarde, o Raimundo foi para umas trilhas próximas que o Fabio havia levado a gente no dia anterior. Para não atrapalhar, preferi ficar me deliciando no comedouro com os bichinhos colorídeos que frequentam o lugar. Mentira - eu estava com preguiça mesmo. 
 
Eu e Raimundo nos comedouros

Algumas aves dos comedouros da pousada

A Elen Dias e o Fábio Barata são pessoas muito especiais, de um carisma e um carinho incrível. Super atenciosos. Antes de dormir nos despedimos da Elen, pois o Barata já tinha viajado a trabalho no dia anterior. A gente tinha que acordar muito cedo para a última etapa da viagem.

E não podia faltar uma fotinha de despedida.

*14 de agosto 2020 - sexta-feira*

Saímos no meio da madrugada para Tapiraí em direção à Trilha dos Tucanos.

Caminho por mim desconhecido. Eu, como sempre, apreensiva em dirigir no escuro. Mas fui numa boa e contei com a ajuda do Raimundo para sair do Guaraú com seu caminho cheio de curvas assustadoras. O tempo piorara e uma chuvinha bem fininha anunciava um dia cinzento e feio.

Chegamos em Tapiraí já amanhecendo, e após sermos super bem recebidos pelo casal Patrícia e Marcão, tomamos um cafezinho, confraternizamos com os amigos que por lá estavam e começamos a fotografar uma infinidade de bichos nos comedouros. Com a chuvinha fina caindo, os bichinhos estavam muito assanhados. O sorriso do Raimundo frente ao que ele só via pela internet era impagável. Parecia criança com brinquedo novo. 


Meu amigo se deliciando nos comedouros

- "piu piu piu" (traduzindo: tiooo, tem banana aqui dentro?)

Raimundo ainda desceu para as trilhas, mas eu continuava com preguiça e fiquei por ali, descansando e fotografando as conhecidas figurinhas dos comedouros e imediações. Destaque para a jacutinga (Aburria jacutinga), que eu não tinha foto legal e o rabo-branco-de-garganta-rajada (Phaethornis eurynome) que deu um show pra gente. 


A Trilha sempre foi um lugar de encontro da galera, por isso é muito gostoso passar o dia por lá. Bastantes amigos estavam passarinhando por lá. Também fiz novos amigos. Encontrei com a minha amiga Leila que tinha ido fazer day-use com um amigo nosso em comum, o Massoco. Também estavam por lá o Geraldo Luiz com o guia Felipe, Ronald Santiago, Márcio Nemer, Ricardo Lima e Altevir Depetris e mais um casal que não recordo o nome.

Leilinha e os passarinhos



Saímos no fim do dia de lá. O caminho de lá para casa é sempre intrincado e cheio de pegadinhas. Chegamos bem tarde na minha casa. Eu estava parecendo que tinha jogado uma partida de futebol ou participado de uma luta de boxe (algo tipo assim, porque nunca joguei futebol nem lutei boxe, mas imagino que ambos devem cansar e muito 😅😂😅😂😅😂). 

Pensa num corpo resmungando e querendo um banho quente e uma cama macia: "Euzinha Faustino Linhares de Albuquerque." 

*15 e 16 de agosto 2020 - sábado e domingo*

No sábado acordamos tarde e fizemos um passeio de paulistano, ou seja, tomamos café numa padaria, com direito a média e pão na chapa. Exploramos mais um pouco os arredores de onde moro, e depois Raimundo foi responder e-mails de trabalho e reorganizar a mala pra voltar pra sua terra.

Cincinato Casa de Pães

No domingo, a mesma coisa. Levei meu amigo conhecer a Galeria dos Pães, lugar geralmente muito concorrido, de grandes filas de espera. Mas agora, pós início da pandemia, estava semi vazio.

Galeria dos pães

Em seguida seguimos para o aeroporto. Chovia bastante, o que me fez recordar o dia que eu me despedi dele em Parauapebas. Lá a chuva só chegou quando eu estava partindo. Aqui foi o inverso, só chegou pra valer quando ele estava partindo. 

Como disse muitas outras vezes, odeio despedidas. Aflora muitos sentimentos tristonhos que não são nenhum pouco macios como ursinhos de pelúcia. Eu sempre sofro com esses momentos, e esse não foi diferente. Embora feliz e com o sentimento de missão cumprida, meu coração ficou apertadinho. Sempre fica. Bom, foi isso.

Mais uma passarinhada no meio dessa nefasta pandemia. Espero que as expectativas do meu amigo Raimundo com relação ao meu Estado tenham sido atendidas. Infelizmente, por conta da pandemia, as possibilidades ficaram bem reduzidas. Não sei qual foi o total de lifers dele. Mas acredito que passou de 100.

Há muitos lugares bacanas ainda pra ele conhecer como o Tanquã (o Tanquã, viu?), Petar, Intervales, Monte Alegre do Sul, Manguezais de Cubatão, Guarapiranga, Cantareira, Ubatuba, Ilhabela, Salesópolis, Santo André, Paranapiacaba, Monteiro Lobato, Mogi das Cruzes, Pousada Oikos em São Luiz do Paraitinga, Galia, Olímpia, Legado das Águas, Salve Floresta e outros que não me vem à memória no momento. E até repetir esses lugares por onde passamos, mas em épocas melhores. 

Espero que um dia ele queira voltar e a gente consiga compatibilizar nossas agendas, pois se nem na pandemia consigo ficar parada, imagine quando ela acabar. Mas desde já vou deixar um aviso para ele: ficar pegando no meu pé enquanto dirijo ou decido alguma coisa, merece clicada imediata no botão "eject passenger". 😅😂😅😂😅😂

Resumindo esses dias todos, passarinhar é muito bom, passarinhar com amigos queridos, melhor ainda. Mas melhor mesmo - mesmo - mesmo é encontrar amigos tão cheios de atenção e carinho durante essas andanças.

Faz bem pra alma e pro coração. Faz nosso dia a dia não ser somente um dia qualquer, mas se tornar "O DIA". E esses dias, embora eu tenha ficado cansada, física e mentalmente, até por conta do estresse pandêmico, foram memoráveis.

Obrigada a todos que nos receberam, obrigada meu amigo Raimundo, por me deixar te levar conhecer um pouco das aves do meu Estado. Foi um prazer enorme. Volte sempre. E para finalizar um música bem antigona, mas que eu gosto muito. 

The Animals - The House Of The Rising Sun


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O dia que eu o deixei no aeroporto (16/08), o tempo tinha mudado e chovia muito. Dá para ver bem nesse vídeo, que eu não lembrava que ele tinha gravado enquanto eu dirigia. O livro que aparece neste vídeo é de autoria da amiga Tietta Pivatto, foi um presente meu para que ele pudesse ler durante sua viagem de volta.


(vídeo by Raimundo Carvalho)

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2 comentários:

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