sábado, 2 de novembro de 2019

MEX - Do México ao Avistar Brasil 2019

Você deve estar se perguntando o que uma coisa tem a ver com a outra, mas vamos lá, vou contar como tudo começou. Inclusive porque coloquei o título "Do México ao Avistar Brasil 2019". Leia a seguir como foi essa viagem e saiba também um pouco do que foi o grandioso evento sobre aves no Brasil. Tudo descrito com muita emoção e passarinhos.

tela na frente da minha poltrona

Na época que eu fotografava automobilismo (2007 a 2013), eu conheci a Cristiane Thurm, que se tornou uma amiga querida. A gente sempre batia papo entre um cafezinho e outro nas salas de imprensa dos autódromos espalhados pelo Brasil.


Cris e eu

O tempo passou e muita coisa mudou nas nossas vidas, porém nosso vínculo continuou por meio das redes sociais. A Cris mudou-se de volta para Cancún, onde já havia passado muitos anos de sua vida. Sabia pouco dela, que era de origem alemã, falava várias línguas, trabalhava como editora de uma revista inglesa que divulgava coisas do Brasil. Via fotos postadas de suas lindas filhas, netinha e dos seus cachorrinhos (Dunkel e Bratwurst) no Facebook.

Dunkel e Bratwurst

Por conta de postagens dela sobre os "dois pestinhas", que hoje amo de paixão, da mesma raça da minha saudosa cadelinha Naná, nosso vínculo virtual se estreitou e um dia ela me convidou pra ir conhecer Cancún e os "meninos".

Há tempos eu fazia planos de ir ao México, até Yukátan, para ver os flamingos em seu habitat. Conversa vai e conversa vem, decidi ir, mas ela me explicou que tinha que ser fora da época dos furacões, dessa forma o período bom seria entre abril e maio, e não podia ser na Páscoa, porque ficava tudo mais complicado. Comecei a olhar passagens.

Consegui comprar passagens com milhagens por uma parceira da GOL, a Aeroméxico (aliás, excelente companhia). Marquei minha ida para o dia 24/04 e o retorno para 14/05. Ia chegar em cima da realização do Avistar Brasil (17/05). 

A Cris trabalha em casa e muito, quase nem respira. Ela planejou um roteiro mínimo para cada um dos dias que eu ficaria lá. Só um porém. Ela só tinha fins de semana e feriados para passearmos juntas. Eu então teria que fazer muitos deles sozinha. Mas fazer passeio típico de turista não é minha vibe e muito menos sozinha. Eu queria conhecer um pouco do México, a vida de seus habitantes e desfrutar um pouco da companhia da minha amiga e dos "meninos".

Mapa com pontinhos por onde estive

Os múltiplos tons de azul do mar de Cancún

Era a primeira vez que eu ia sair do Continente Sul-americano sozinha, isso sem dominar nenhuma língua a não ser a pátria. Mas bora respirar e se encher de coragem, fechar os olhos e "escorregar tobogã abaixo até o final".

Confesso que foi uma das experiências mais edificantes da minha vida. Não esperava ver minha alma crescendo tanto interiormente, nem que dentro de mim tivesse tanta determinação e coragem guardadas. Sempre fui fóbica com aeroportos, internacionais então, era pra mim um "deozolivre" total. Você deve estar rindo e pensando: "até parece, ela vive viajando". Aposto que nunca pensou que eu sofresse em aeroportos, né. O pânico era tanto que eu viajei pro México pra ficar 20 dias com uma malinha de bordo e a mochila com equipamento. Nem eu acreditei que ia conseguir fazer isso.

Explico porque: eu tinha direito a uma mala despachada de 23 kg. Ocorre que ia passar pela aduana na Cidade do México, e isso inclui retirar a bagagem despachada, enfrentar filas, revista, perguntas, exames de documentos, despachar bagagem de novo, o que pode demorar uma eternidade e eu tinha menos de 3 horas para a conexão até Cancún. E como fiquei com receio do tempo de permanência não ser suficiente, resolvi levar tudo comigo a bordo para agilizar.

Bom, o dia chegou, lá fui eu pra Guarulhos onde fui super bem atendida pela Aeroméxico. Fui pra sala de embarque e aguardei, com o coração na mão.

o avião aguardando o embarque

A viagem foi tranquila, na ida até o México uma brasileira com sua filhinha sentaram-se ao meu lado e foi bem tranquilizador. Conversamos muito. Quanto à Aduana da Cidade do México, a parte burocrática foi um simples "buenos dias", carimbo no passaporte e pronto. Liberada. Mas a passagem da bagagem pela esteira foi engraçada. Fizeram eu abrir a mala, colocaram tudo pra fora, bagunçaram tudo, que estava "virginianamente" arrumado, e não encontraram nada que justificasse tanta bagunça.

Eu tenho bastante noção do que pode e do que não pode ser levado, mas o rapaz que me revistou era um "sem noção". Aí o cara disse que era por causa de um pente de plástico que ele pegou dentro da necessaire e balançou bem na minha cara.  Ele chamou o supervisor que olhou para o objeto e acenou com a cabeça pra deixar passar, tipo, não é nada. Eu mereço, né? Quase o mandei pegar o pente e ... pentear macacos. O duro foi organizar tudo de volta na mala rapidamente com medo de perder a conexão. Olha abaixo o causador do perrengue. A caneta é só pra dar noção de tamanho.

"o pente criminoso"

Enfim, no final deu tudo certo e tomei a primeira cerveja no aeroporto enquanto aguardava o meu próximo voo, que atrasou bastante.

Olha a carinha de cansaço durante a passagem pela Cidade do México

Cheguei em Cancún bem tarde e a Cris estava me esperando no aeroporto. O fuso horário lá é o mesmo do Acre, duas horas a menos que São Paulo.

Cheguei na casa dela e fui recebida por duas salsichas escandalosas. Os pequenos me receberam aos latidos, amedrontados, mas depois, quando viram que eu não ia fazer mal pra "mamis deles", criaram um vínculo regado a lambidas, colo e pelos que me enche os olhos de lágrimas até hoje quando lembro. Foi amor puro o tempo todo.

*(Soube esses dias que o Brat tá dodói - fique bem little boy, titia te ama muito)💕💕💕

Dunkel, eu e Bratwurst

O primeiro café de muitos na casa da Cris

Muito mimo gastronômico 

Um dos "catiorros", o Brat, tem uma história que emociona. Cris fuma e foi jogar as bitucas que recolhe num recipiente, no lixo de uma conveniência. Ouviu barulho no lixo e logo em seguida um ganido. Eram dois filhotes recém-nascidos. Um transeunte acabou ficando com a fêmea e a Cris decidiu levar o menorzinho pra casa. Esta salsicha marronzinha recebeu o nome de Bratwürst (Bratwürst é uma salsicha de origem alemã). Brat (para os íntimos) é medroso, melindroso, mas muito amoroso e inteligente. Comigo, depois do escândalo inicial, foi um caso de amor instantâneo. Era grude o tempo todo.


No dia seguinte (25/04), enquanto a Cris passeava com os meninos pelos jardins do condomínio, eu acompanhava clicando as aves que por ali perambulavam. Cliquei tudo que vi e tinha penas. Destaque para o sabiá-da-praia (Mimus gilvus).

sabiá-da-praia (Mimus gilvus)

Pasme! No dia seguinte chegou um e-mail da Cornell (e-Bird) dizendo que este sabiá será "splitado" (ou seja dividido em duas espécies plenas).

Ele irá chamar-se Mayan Mockingbird (Mimus gilvus leucophaeus), por ser uma subespécie endêmica de Yucatán https://ebird.org/news/to-split-a-mockingbird - (para ver a matéria mude o idioma do site para inglês se você utiliza em português como eu)


Quem chamava a atenção todos os dias era o bando de Great-tailed grackle (Quiscalus mexicanus), corvo bonito, presente em todos cantos onde passei, seu canto é muito estranho. Ele imita outras espécies e impõe presença.

Great-tailed grackle (Quiscalus mexicanus)

Depois fomos ao centro de Cancún, onde "cambiei" alguns dólares em pesos mexicanos. Aproveitamos para passear no Mercado 23, uma espécie de feira e lojinhas juntas. Amei o passeio fora do "circuito milionário" de Cancún, que basicamente se resume ao famoso Setor Hoteleiro.


eBird
Cancun - 25/05
https://ebird.org/checklist/S55412508

Dia 26/04 fiquei em casa "trabalhando". Eu sou voluntária para ajudar o Guto Carvalho com as coisas do Avistar Brasil. Gosto de fazer textos bem elaborados para divulgar os palestrantes. Então passei o dia brincando com os meninos, pesquisando, montando textos e divulgando no Grupo Avistar do Facebook, enquanto trocava ideias com o Guto e a Erika Hingst-Zaher (do Butantã) pelo wapp.


A vizinhança da Cris, lugar tranquilo e agradável de morar

eBird
 Cancun - 26/05
https://ebird.org/checklist/S55426603

No dia 27/04, a Cris me levou ao Setor Hoteleiro. Fomos até Mirador Playa De Los Delfines. Almoçamos em La Isla, perto de onde estávamos. Comida e cerveja maravilhosas. Fiquei triste porque a Cris me aconselhou a não levar a câmera e tinha lindas gaivotas e trinta-réis que até poderiam ser lifers. *(só que não eram - ufa!)

La Isla

A chegada de preto, toda tímida, e depois o "vamos a la playa" e toca tirar a roupa e por o pé na areia e na água - E tem coruja perto da praia, sim senhor!  

Olha o lifer aí 

Do café à cervejinha, e muitos quitutes mexicanos, amei tudo.

eBird
Zona Hotelera de Cancún--Playa Delfines

No dia 28/04 fomos ao Mercado 28 (coincidência né? Kkkkk). Que lugar delicioso, colorido, cheio de lojinhas e gente simpática, uma delícia. No Restaurante El Cejas experimentei uma "chelada" (cerveja com gelo, sal e limão) e um ceviche de encher os olhos e a barriga. Aproveitei e comprei muitas coisas de "pajaritos" pra enfeitar minha casa. Demorei a conseguir falar "parraritos". kkkkk A Cris me corrigia o tempo todo pois eu dizia "passaritos", num delicioso portunhol que só minha cabeça conseguia entender.


Como fazia sempre, durante os dias que ficávamos em casa, enquanto a Cris trabalhava, eu saia pelo Condomínio buscando mais "parraritos".
Mais trabalho durante os dias 29 e 30/04. Só saí pra andar um pouco dentro do Condomínio e clicar alguns passarinhos, torcendo pra aparecer alguma novidade. No Condomínio, ao nascer o dia, sempre havia muitas aves cantando desde muito cedo. Impossível manter-se na cama por muito tempo. 


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Cancun - 29/05
https://ebird.org/checklist/S55573459

Cancun - 30/05
https://ebird.org/checklist/S55607438

No dia 1º de maio, feriado lá também, fui conhecer uma das filhas e a netinha da Cris - a Marcela e Isadora.


Fui muito bem recebida, mas ficamos pouco tempo. Seguimos novamente para o Setor Hoteleiro onde almoçamos no Mocambo, com deliciosas "cheladas", cervejas com aperol, camarões  e ceviche de novo (acho que viciei).



Até fiz uns cliques de passarinhos, mas essa parte de Cancún, apesar de belíssima, tem uma ocupação esquisita que não combina com uma cidade tão receptiva. Dizem que não existem praias estritamente privadas no setor hoteleiro, onde estão as mais lindas e famosas de toda Cancún. Ocorre que muitos hotéis, localizados na beira-mar, fecham a área de forma que apenas os seus hóspedes possam usá-las, dificultando a passagem de quem está caminhando ao longo das mesmas. Há pequenos trechos de praias públicas, mas são lotadas e longe dos melhores points.

Olhe abaixo a pequena praia do Mocambo. Do lado direito, área "quase privativa" de um hotel. O píer à esquerda é de outra empresa. Tinha uma pessoa controlando o portão que dá acesso ao píer, aliás  uma pessoa muito antipática e grossa, que não permitiu que eu entrasse para clicar aves que estavam lá pousadas. Bom, o jeito foi ficar tomando mais "cheladas" e clicar tudo de longe.

Barreiras de lado a lado, limitando o acesso


o píer cheio de aves

praias "não privadas" ao longe clicadas com a tele.

Algumas aves no espaço do restaurante, uma inclusive dentro dele


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Mocambo Restaurante, Zona Hoteleira, Cancun
https://ebird.org/checklist/S55661869

Dia 02/05 permaneci em casa descansando e produzindo mais textos. O Brat ficava me seguindo e olhando o tempo todo, pedindo colo, eita grudinho bom.


Ah! Esse olhar me derrete toda!

No dia 03/05 fomos para o Rancho Libélula Dourada, em Leona Vicario, de propriedade de uma amiga da Cris, a simpaticíssima Maria Inés Gonzales. Ela estava inaugurando sua pousada. Fui a primeira cliente. Seu filho Marco A. Gonzales nos buscou em Cancún. Eu sequer imaginava que seria a mais inédita passarinhada da minha vida e que toda a experiência serviria para eu utilizar na minha palestra no Avistar. 

Fotos do Rancho, do nosso quarto e do cenote* que tem dentro do terreno

*Em Cancún há muitos cenotes (depressões inundadas de água, geralmente em terrenos calcários). A palavra “cenote” vem do maia tz’onot, e quer dizer poço, abismo. Também chamados de dolinas, os cenotes são como artérias subterrâneas de água doce, cavernas calcárias inundadas de água cristalina.

Maria Inéz nos recepcionando e abaixo nosso café da manhã

A happy hour acontecia ao redor de uma fogueira ou à luz de velas.

Eu passarinhei sozinha na Pousada e seus arredores. Não encontrei ninguém que gostasse de caminhar longas distâncias pelo mato, sob o sol forte e calor em busca de passarinhos para me acompanhar. Mas pense, nem roupa de passarinhar eu tinha levado, de tão pequena que era a mala. Tive que improvisar. Mas deu certo, punha o celular num dos bolsos do short sobre a calça bailarina e saia procurar os bichinhos. Lancei moda. kkkkkkk


Teve um dia que eu acordei ouvindo um canto conhecido, suspeitei ser o peixe-frito (Dromococcyx phasianellus), confirmei no Merlin o som e segui pela estradinha que passa em frente a pousada tentando localizar e me aproximar. E encontrei o bicho, não deu fotão, mas consegui fotografar e gravar o som. Era um lifer a muito desejado.

Fotografei muitas aves que não tem registro de ocorrência no Brasil. Eu as chamo de lifer da lista global de aves. Essa foi a parte mais legal, fotografar e identificá-las pelo app Merlin, usar o canto para checar a correspondência e tudo mais. Essa experiência foi impagável. Um grande aprendizado. Desta vez fiz o dever de casa direitinho e estudei previamente as aves que eu poderia encontrar na região. Baixei o pacote específico e fui só prestando atenção. E tudo usando os aplicativos que eu iria mencionar durante minha palestra no Avistar. O local tem muita mata e muitos "pajaritos". É incrível. A maior parte cliquei dentro do terreno da Pousada. Alguns nas cercanias. Fiquei com vontade de ficar mais dias lá para explorar um pouco mais, mas meu tempo era contado.

Cito espécies como o lindo turquoise-browed motmot (Eumomota superciliosa), spot-breasted wren (Pheugopedius maculipectus), buff-bellied hummingbird (Amazilia yucatanensis), Yellow-faced grassquit (Tiaris olivaceus), Hooded Oriole (Icterus cucullatus), yellow-throated euphonia (Euphonia hirundinacea), melodious blackbird (Dives dive),  brown jay (Psilorhinus morio), entre outros. Até o anu-preto de lá é outra espécie, é o groove-billed ani (Crotophaga sulcirostris).



Você pode verificar a lista de cada dia nos links para o eBird espalhados pelo post e conhecer melhor cada uma delas. 

Destaque para a belezinha de bico-chato-de-orelha-preta (Tolmomyias sulphurescens ssp cinereiceps). Uma subespécie da que ocorre no Brasil.


Fiz quatro lifers que ocorrem na lista do CBRO (Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos), ou seja, aves que já foram registradas no Brasil. Muitas delas apenas passam pelo Brasil e até mesmo pelo México, pois são migratórias. 

Os lifer foram bem-te-vi-de-barriga-sulfúrea (Myiodynastes luteiventris), peixe-frito (Dromococcyx phasianellus), juruviara-verde-amarelada (Vireo flavoviridis) e mariquita-de-garganta-preta (Setophaga virens).


eBird 
Rancho Libélula Dourada - Leona Vicário
3 mai 2019
4 mai 2019
https://ebird.org/checklist/S55779001
5 mai 2019

Teve uma manhã que o Marco me levou junto com o garotinho dos caseiros até uma propriedade vizinha chamada Parque Can'ek. O pequeno Santi e o dono do local ficaram encantados com a minha felicidade ao encontrar muitas aves por lá.


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Parque Canek - 4 mai 2019
https://ebird.org/checklist/S55776931

Após as despedidas e agradecimentos, seguimos pra casa, com paradinha no caminho para almoço e mais umas fotinhos. No retorno passamos por Puerto Morelos. Tinha muitas gaivotas, pelicanos e tesourões.





eBird
Puerto Morelos
5 mai 2019
https://ebird.org/checklist/S55997169

Passei os dias seguintes na casa da Cris tomando muito café e Vitaloe (com trocitos de sabila - sua fórmula contém 30% de aloe vera orgânico) para sair um pouco da preguiça e continuar divulgando os palestrantes do Avistar. Enquanto isso eu curtia "os meninos", que pareciam dizer: "Tiaaaa, já que você e a mamãe não deixam a gente entrar no seu quarto, nós vamos invadir e pular o muro (leia-se o puff), tá? Como não conseguiram, o jeito foi os dois tirarem uma sonequinha na sala - ô dó!


Voltamos ao Mercado 28, desta vez de tuc-tuc e não de táxi, para comprar mais Vitaloe e outras guloseimas e acabei fechando um pacote até Río Lagartos para ver os sonhados Flamingos (Phoenicopterus ruber). Bem mais barato dos que eu havia visto na internet.

o tuc-tuc ao fundo, eu e a Cris nele e o Vitaloe à direita

A semana parecia se arrastar, a passos de tartaruga. De repente, o dia tão esperado chega e lá estava eu a caminho de Río Lagartos - Yucatán, para ver os almejados flamingos.

Dentro do micro-ônibus 

Paramos em Tizimín, onde ficamos 40 minutos conhecendo o local e comendo alguma coisa. Fiz até uns bichos bonitinhos na praça. Nossa tour era composta por mexicanos e alguns estrangeiros. Parecia uma grande família barulhenta. Achei o máximo. O guia da excursão, Jesus Lopez era uma simpatia de pessoa e muito atencioso. A Cris explicou pra ele que eu era uma birdwatching no Brasil e muito conhecida no meio. Disse-lhe que eu havia ido ao México especialmente para ver os flamingos, mas que gostava de fotografar todas as aves pelo caminho. Ele disse que me daria uma atenção especial. E deu mesmo, conforme vocês irão ler a seguir.

Jesus, Cris e eu em Tizimin
white-winged dove (Zenaida asiatica), maria-cavaleira-pequena (Myiarchus tuberculifer),
great-tailed grackle (Quiscalus mexicanus), golden-fronted woodpecker (Melanerpes aurifrons)

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Tizimín
https://ebird.org/checklist/S56171603

De Tizimín seguimos para Las Coloradas. Esses lagos são cor-de-rosa e ficam dentro da Reserva da Biosfera Ría Lagartos, na vila de pescadores de Las Coloradas. É conhecido mundialmente pela cor de suas águas. As lagunas cor-de-rosa são, na verdade, salinas que pertencem a uma empresa de extração de sal da região. Formado por um frágil ecossistema, a cor rosa das lagunas vem da combinação de uma grande quantidade de microrganismos com a alta salinidade das águas. Esses microrganismos são plânctons avermelhados e pequenos crustáceos chamados “artêmias”.


Antigamente era permitido entrar nas lagunas, mas hoje não pode mais nem chegar na beira. A área está protegida por guias e seguranças. Ali se extrai grande parte do sal que abastece o México e, portanto, tem que ser evitado qualquer risco de contaminação. Outro bom motivo é que a alta salinidade é prejudicial à pele, que resseca e pode até causar queimaduras.

Havia muitas aves aquáticas nas margens de um dos lagos, no lado oposto às lagunas rosas, inclusive flamingos bem longe. Cliquei todas e fiz um lifer, o maçarico-pernilongo (Calidris himantopus), conforme o Merlin identificou na hora e eu confirmei depois. Era proibido ficar parando por causa dos fiscais, podia se fazer algumas fotos, mas sempre junto do grupo. Eu sempre ficava pra trás, porque será heim? 

Quatro espécies de Calidris nesse quadro, maçariquinho (Calidris minutilla),
maçarico-pernilongo (Calidris himantopus), maçarico-de-sobre-branco (Calidris fuscicollis) e
maçarico-branco (Calidris alba)

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Las Coloradas
https://ebird.org/checklist/S56173435

Depois seguimos para um píer, onde Jesus (pronuncia-se "Resús") nos distribuiu em lanchas com 6 passageiros cada. Como eu era uma passageira especial, conforme Cris tinha explicado pra ele, Jesus foi com a gente e orientou o piloteiro a parar em todas as aves e a ficar mais tempo nos flamingos do que de costume.

Navegamos até a divisa da lagoa com o mar, onde fica o inicio do golfo do México. O passeio incluiu a observação dos sonhados flamingos, garças, gaivotas, cormorões (parecidos com nossos biguás).

Logo que saímos, de cara avistamos um gavião que foi lifer pra mim: gavião-caranguejeiro-negro (Buteogallus anthracinus). Havia muitos pelicanos também. Enfim, chegamos nos sonhados flamingos, eu estava com sorriso de orelha a orelha. Eram muitos, milhares, de encher os olhos e os cartões.


Pensa numa criança diante de uma vitrine de doces numa padaria. Bem assim. Há uma distância de aproximação mínima permitida por norma de modo a resguardar o bando. Ancoramos a uma distância segura e fiz fotos até enjoar. Foi só quando falei que estava satisfeita que Jesus deu ordem para seguirmos, mas sempre parando para eu clicar qualquer bicho que tivesse penas.


Num determinado ponto, paramos para o famoso banho esfoliante de lama, as meninas do barco, incluindo a Cris, se lambusaram até. Eu não curto fazer isso, preferi ficar clicando. Jesus me acompanhou na busca por aves pelas proximidades. Rolou apenas batuíra-bicuda (Charadrius wilsonia) e um borrelho-de-coleira-interrompida-americano (Charadrius nivosus).

Todo mundo lambecado, menos eu, Jesus e o piloteiro.

Aves de Río Lagartos

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Reserva de la Biósfera de Río Lagarto
https://ebird.org/checklist/S56174573

Almoçamos na cidade de Río Lagartos. Aproveitamos para fazer foto do nosso grupinho e conhecer um pouco o local e sua cultura antes do retorno. Jesus é muito bom historiador, embora eu entendesse apenas um pouco do que ele falava. A Cris ajudava no que eu não compreendia. Eu só sabia dizer: Habla mas despacito, por favor.


Jesus explicou que a cidade chama-se Río Lagartos em função de muitos "cocodrilos" que existiam antigamente (crocodilos como a gente fala aqui kkkkkkkkkkkk).

Recentemente em minhas pesquisas para fazer este post descobri um site especializado em observação de aves em Río Lagartos - a Rio Lagartos Tour com Diego Nuñez  - Pena que só foi agora. Mas fica a dica, que consegui por meio do site Maine Birds.

Continuando. Já retornando fizemos um "pit stop" na Granja De Cocodrilos Itzamkanac. Uma pessoa do local e o nosso guia Jesus me levaram passarinhar no meio dos "cocodrilos". 

Acabei vendo um ninho da Garza-tigre, uma espécie de socó-boi endêmico do México, o
bare-throated tiger-heron (Tigrisoma mexicanum). O casal fica perambulando no local sem medo dos visitantes. Eu adorei e fiz fotos lindas. Lá a maior atração além dos jacarés (é óbvio), são os urubus, que descem para pegar alimentos jogados pelos empregados do lugar. Uma atração à parte. Imagina, um monte de turistas fazendo selfies com urubus. Registrei também uma espécie de jaçanã, a northern jacana (Jacana spinosa).



Fotos feitas na Granja de Cocodrilos

eBird 
Granja de Cocodrilos Itzamkanac
https://ebird.org/checklist/S56173580

Já com o sol se pondo, voltamos à Cancun. Jesus veio conversando comigo e Cris. Eu já estava arranhando bem um portunhol kkkkkk, mas muita coisa a Cris tinha que traduzir, como quando Jesus disse que eu era "una muy buena persona, toda paz y amor". E a Cris, que me conhece a muito tempo, disse a ele: "boazinha, paz e amor até a página dois, versículo três. Provoca ela pra ver." Até hoje choro de rir ao lembrar a cara dele sem entender nada. Chegamos em casa quase uma da manhã. Caímos na cama e desmaiamos.


No dia 12, meu penúltimo dia, iríamos almoçar na Isla Mujeres, mas Cris e eu estávamos muito cansadas do sábado intenso em Río Lagartos. Buscamos os meninos no pet-hotel e tratei de começar a me organizar. Faltava pouco pra voltar pra casa. Estava com saudades da minha terra, da minha casa, das minhas coisas, apesar de estar muito feliz por lá. 

Dia 14 acordei ansiosíssima. Meu coração estava apertadinho por diversos motivos. Algumas coisas me fizeram lembrar de uma frase que gosto muito: "você é o único responsável por suas escolhas". Coisas inesperadas acontecem, mas "xá" pra lá. O que mais me aperreava era a proximidade com o Avistar, o maior evento sobre aves do Brasil, que acontece todo terceiro final de semana de maio. Eu estava ansiosa para receber queridos amigos em minha casa. Eu queria preparar tudo o melhor possível. A casa tinha que estar impecável e a geladeira cheia... (de cervejas, claro kkkkkkkkkkkkk)

A grande festa me aguardava, mas minha alma parecia não querer sair do México. Passei a noite no avião, dormi muito pouco na desajeitada poltrona. Mas enfim...



Quando o dia amanheceu, 6:13h o avião tocou o solo paulista. O coração acelerou. Pensei comigo, ai que bom, logo-logo estarei em casa. Mas que doce ilusão. Passei na aduana rapidinho, porém, o Uber demorou uma década pra chegar por conta do tráfego dentro do próprio aeroporto. E mais ainda, a Rodovia Ayrton Sena estava congestionada por conta de uma blitz.




Cheguei em casa às 9:30h e Maria, minha amiga e ajudante já estava preparando a casa para os meus ilustres e queridos hóspedes: Vanilce Souza, Catarina Tokatjian, Jorge Matos e Francisco Diniz.

No fim do dia, eu estava um caco, cochilando sentada. Lembro de estar na cozinha com a Maria e ela ter me mandado ir dormir na cama pra não cair da banqueta.

Mas dia 16 acordei animadíssima e os hóspedes começaram a chegar. Primeiro foi a Vanilce, e lá fomos nós para o supermercado buscar cervejas. Mas eu precisava comprar coisas pro café da manhã também, entre eles, um pouco de leite. Descarreguei tudo na mesinha da cozinha e a Van tirou uma foto e postou dizendo que todo mundo ia encher a cara, menos ela, que aquele parmalat da foto era dela. A gente se acabou de rir com essa história. kkkkkkkk



À noite nada como curtir uma happy hour em casa mesmo. Deixamos de sair pra ver se a gente conseguia dormir cedo. Que ilusão. Bebemos e conversamos até as duas da manhã. Além dos hóspedes, recebi os dois queridos guias e amigos Ricardo Plácido e Filho Manfredini, acompanhados de amigos e amigas. Gente! Pensa numa gente maravilhosa. Que noite deliciosa. Foi riso de chorar e de doer a barriga. E tome papo e história de passarinho até dizer chega! 


Eu no meio, cercada por quatro dos Reis do Norte. 
Brincadeira que fiz com meus hóspedes e amigos guias na Região do Norte
Ricardo, Vanilce, Filho e Francisco

Na sexta (17/05), abertura do Avistar, minha alma, que ainda não regressara de Cancún, largou meu corpo de ressaca e mandou eu me virar sozinha. Beleza pura, raciocínio zero, errei o caminho várias vezes até chegar ao novo local do Avistar. Acabamos perdendo a abertura do evento.


Como todo ano, sempre chove, pára, chove, pára, esse Avistar não foi diferente. Mas isso não desanimou os apaixonados por penosinhos. Até pelo contrário, tal qual as aves, foi um alvoroço geral, muita gente, muita alegria, muitos amigos. E assim passamos um dia intenso até o anoitecer. 

Sexta 17/05/2019 - alguns momentos preciosos com vários amigos.

No fim do dia, todos nós só pensávamos em voltar pra casa e dormir. A turminha ainda foi ao shopping na Paulista, eu, no entanto, "desmaiei" na suite master assim que cheguei.

No sábado (18/05) eu ia dar palestra, fazer uma importante homenagem e confesso que não estava no meu melhor ainda. Mas no fim deu tudo certo, missão cumprida, todo mundo apreciou minha explanação e a homenagem que havia preparado (com o auxílio de amigos e da esposa dele Nara Muniz) para o mentor do Wikiaves foi um sucesso. Reinaldo Guedes se emocionou com a surpresa e eu fiquei muito feliz. Abaixo o vídeo apresentado pra ele logo após a minha palestra.


Nesse espaço, na próxima foto, quero deixar uma homenagem a uma pessoa muito especial, dona de um lindo sorriso. Foi a última vez que pude abraçar e sentir o carinho da querida amiga Dina Galdino. A "bonitona do dia" nos deixou dia 29 de junho e foi voar em outros céus junto com seus amados passarinhos. Dina querida, a gente se via pouco na vida real, mas todos os dias você me dava bom dia no Facebook e nos brindava com uma foto linda de ave com os dizeres "o bonitão do dia". Jamais vou me esquecer de você.

Eu e a querida Dina Galdino.

Sábado 18/05/2019 - alguns momentos preciosos.

Findo o dia, voltamos pra casa e fomos direto pro Asterix, um barzinho aqui do lado, para confraternizar e comentar os acontecimentos (leia-se fofocas) do dia durante o Avistar Brasil. Foi muita risada, muita história e muita cerveja. Uma excelente "corujada".

Francisco, Vanilce, Eu, Filho, Jorginho, Catarina e Ney


Por fim, fomos passear e fazer fotos na "minha" icônica Paulista. De repente o Filho Manfredini me puxou e fez uma foto de nós dois abraçadinhos. Disse que era pra tirar onda com um amigo de Carajás pelo wapp. Eu não entendi nada, mas confesso que senti muitas saudades da turminha que conheci durante minha viagem ao Pará ano passado (veja mais aqui).


Cansada, de alma lavada e perfumada, dormi feito anjo. E eis que chega o domingo (19/05), último dia do Avistar. Acordei menos pilhada. Saímos cedo, só parando no caminho para tomar café numa padaria. Conseguimos chegar bem cedo no evento e circular um pouco mais.


Domingo 20/05/2019 - alguns momentos especiais.

Voltamos pra casa cedo e cheios de histórias pra contar. Mesmo cansados, ainda demos um rolezinho pela Avenida Paulista.

Vanilce Passarinha Souza - Eu, Chiquinho, Van e Filho

E assim terminou mais um Avistar, sempre muito intenso, muita correria, encontros e desencontros. Muitas "selfie-linhares". Em relação a isso nem me fale. Faltou "selfie" com MUITOS amigos, novos e antigos. Correria de doido, vai pra lá, vem pra cá, impossível estar onipresente em todos os momentos que o evento oferece. O Avistar é magnânimo por si só, mas a presença de todos é que o torna cada vez melhor e maior. Eu disse que esse ano ia ser diferente, que ia abraçar todo mundo e não deixar ninguém passar sem uma fotinha, mas coitada de mim, tinha hora que nem lembrava mais quem eu era. Teve bom, muito bom. 

Desta vez não teve passarinhada pós-Avistar. Na segunda-feira, a casa acordou vazia de dar dó. Mas ano que vem tem mais. Espero encontrar todo mundo no próximo ano.

Eu e Guto já combinamos, vou ter uma barraquinha só pra mim... kkkkk não, não é a barraca do beijo não (até que gostei mais dessa ideia kkkkkkk), mas da "selfie-linhares". É só chegar e a gente faz uma foto juntos. Tenho certeza que 2020 teremos o melhor Avistar de todos até hoje.

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Deixo uma música para você que conseguiu chegar até o final deste post 
Queen - We Are The Champions


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Um comentário:

  1. Passeando pela net procurando coisas legais das quais me interesso, lembrei de seu blog e vim dar uma espiadinha.
    Gostei demais Silvia, é tão bom ver todas estas histórias. Acontecem tantas coisas por trás das fotos dos passarinhos kkkk... não é mesmo? Tantas histórias, sentimentos, tantos lugares lindos, pessoas e amizades que muitas vezes levamos pra vida...
    As vezes penso, como pode isso passar desapercebido por tantos passarinheiros? Andamos em meio a plenitude da natureza e temos a oportunidade de vê-la se revelar em várias formas quando estamos em meio as florestas, aos campos altos e diversos biomas... Tão apaixonante e magnifico.
    Fico super feliz que você seja uma destas pessoas apaixonadas por viver, sentir a vida e expressá-la, seja nas fotos, seja nas histórias.
    Um beijão e muitas passarinhadas incríveis pra você.

    Mel Simas

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