quarta-feira, 23 de abril de 2025

RO/AM/AC - De Porto Velho à Rio Branco (P2)

P2 - Passarinhada 02 – de Porto Velho à Rio Branco


Se você não leu a primeira parte dessa expedição RO/AM - Expedição Urumutum (P1) 👉clique aqui👈e leia para poder entender a separação dessa viagem em duas passarinhadas e dois posts.

De volta da primeira parte da expedição, eu e Kenny chegamos em Porto Velho no final do dia 01/09. Fui direto para o imóvel que eu e os meus amigos Gustavo Dallaqua (@gustavo.birds.nature) e Luciano Bernardes (@lucianobernardesguia) alugamos via aplicativo. 

Eles chegariam de São Paulo em algumas horas. Fiz arrumar minhas coisas e descansar, porque ia começar a Parte 2 dessa Expedição, que eu apelidei de P2, ou Passarinhada 2, para facilitar.

1º Dia – 02/09 - segunda-feira


Após a chegada do Gustavo e do Luciano, dormimos um pouquinho e logo depois, nas primeiras horas do dia, já estávamos prontos para começar a nova aventura.  

Vou iniciar o relato com a ave que me marcou nessa segunda parte da expedição: o charmoso e enigmático jacamim-de-costas-brancas (Psophia leucoptera).

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Luciano Bernardes se expressou assim na postagem dessa espécie: 

"Sempre me perguntam quais as espécies que eu mais gostei de fotografar, é sempre difícil responder, principalmente escolher uma preferida, são mais de dez anos fotografando aves por todo o Brasil, muitas belas e raras espécies a gente nunca esquece. 

Agora, essa espécie em especial foi uma das mais emocionantes, a sensação foi de ver um alienígena pela primeira vez, não sei explicar o motivo, mas foi incrível. Sabíamos da existência da espécie no local, porém, a dificuldade existia, se trata de uma espécie bem rara e muito arisca. 

Caminhávamos pela floresta sobre um calor e umidade intensa, o desgaste físico já tomava conta de todos, já estávamos pensando em ir para outro local. Um barulho entre as folhas chamou a atenção de todos, suspense total naquele momento, de repente, um bando de aproximadamente oito indivíduos aparece, confesso que fiquei emocionado com aquele momento. 

Muitos clicks e tá aí uma das espécies que mais gostei de fotografar. Agradeço muito ao amigo Kenny Uéslei que me proporcionou esse momento maravilhoso e aos amigos Gustavo Dallaqua e Silvia Linhares por fazerem parte desse dia tão especial."

Assino embaixo, Luciano. Pura poesia.

Seguimos conforme programado pelo Kenny, direto para a Linha C30, um ramal que é considerado um dos grandes hotspots de Porto Velho/RO e Canutama/AM. 

Se olhar o print abaixo vai ver como é a divisa dos dois em Estados em relação ao ramal, ora você está de um lado, ora do outro, mesmo sempre andando em linha reta.

print by Silvia Faustino Linhares

A fumaça continuava obscurecendo nosso amanhecer, deixando o dia surreal. O sol parecia que estava se pondo e não nascendo.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Muita coisa programada foi mudando com o passar dos dias. Mas começamos super bem. Após o café da manhã, seguimos com os planos. 

Mesmo sem um céu azul animador e um luz favorável, que permitisse fotos maravilhosas, o talento do Kenny e o seu  conhecimento das aves da região nos trouxe muitos avistamentos legais nesta manhã. 

Só lembrando que as aves amazônicas gostam de poleiros muito altos, e nem sempre a gente consegue fotos espetaculares, de encher o quadro. Mesmo assim, olhe abaixo quanta raridade.

1 - capitão-de-fronte-dourada (Capito auratus)
2 - araçari-mulato (Pteroglossus beauharnaisii)
3 - ariramba-da-capoeira (Galbula cyanescens)
4 - beija-flor-azul-de-rabo-branco (Florisuga mellivora)
5 - cantador-sinaleiro (Hypocnemis peruviana) 
6 - rabo-branco-amarelo (Phaethornis philippii)
7 - saripoca-de-coleira (Selenidera reinwardtii)
8 - pipira-vermelha (Ramphocelus carbo)
9 - chorozinho-esperado (Herpsilochmus praedictus)

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

O almoço para mim teve cara de Déjà-vu. Nós fomos na famosa e querida D. Terezinha e lógico que foi uma delícia matar as saudades dela e degustar novamente seu substancioso almoço e café coado na hora. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

No período da tarde encontramos o nosso amigo Wendell Luccas guiando o casal amigo Rubens Matsuhita e Ane na Linha C1 no município de Porto Velho.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Kenny Uéslei

Meus pés continuavam inchados e doloridos e eu mal conseguia acompanhar os meus amigos direito, todos empolgados com os inúmeros lifers que vinham fazendo. 

Pular cerca para acompanhá-los nem pensar. Eu fazia é procurar qualquer toquinho para sentar como esse abaixo que o Luciano estava esquentando pra mim. 😂😂😂

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Luciano Bernardes

O calor não dava trégua. Ainda bem que levei meu lequinho.

arquivo pessoal Luciano Bernardes

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Nesta tarde fiz poucas fotos, mas só lembrando que as aves amazônicas são mais ativas ao amanhecer.

Abaixo na sequência alguns destaques:
1 - araçari-de-bico-marrom (Pteroglossus mariae) 
2 - periquito-de-cabeça-suja (Aratinga weddellii)
3 - pica-pau-amarelo (Celeus flavus) 
4 - tesourinha (Tyrannus savana)

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas o show mesmo ficou por conta de um bando de marianinha-de-cabeça-amarela (Pionites leucogaster). Elas conseguem nos encantar.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Eu, Kenny, Gustavo e Luciano
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Pegamos o carro e fomos voltando, nisso uma linda coruja-buraqueira (Athene cunicularia) num mourão, "disse": ô galera, "xispa" daqui que eu estou com soninho. Vão-se embora tomar cerveja gelada. Me deixem em paz! 🦉🤍🤜🤛

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Na volta, paramos no Bartô e mandamos ver um lanche bem substancioso que, com uma geladinha caiu muito bem. Nosso amigo passarinheiro Carlos Alexandre, de Porto Velho, veio confraternizar com a gente. Pena que esquecemos de fazer a selfie com ele.

Ao deixarmos o Kenny em casa, pegamos emprestado um colchão de solteiro, uma vez que o tal ap. que contratamos para 4 pessoas, não especificava que só tinha 2 camas de casal, e Luciano e Gustavo não estavam dispostos a dormir de conchinha. 😬🙄🤣🤣🤣

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Após nos ajeitarmos, fui para o meu quarto e meus pés estavam me assustando. Eu dormi pensando assim: se ele não desinchar amanhã cedo eu vou para o pronto-socorro. 

Mas o danado ficava com tanto medo de ter que tomar injeção que amanhecia um pouco mais "murchinho". Para quem não sabe eu tenho verdadeiro pânico de injeção. 💉😖😵‍💫😝🤢🤮

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

2º Dia – 03/09 - terça-feira

Após o café da manhã na Dona Terezinha, fomos para o Ramal do Lula. Um local novo para mim. Chegar lá é um pouco complicado, temos que atravessar um lago de barco, e depois subir uma pequena encosta, mas com a ajuda de todos, inclusive do Seu Lula, eu fui numa boa. E o local é espetacular. Valeu demais.

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Alguns lugares tinha passarela e eu torcia para me manter equilibrada. O Luciano como excelente  fotógrafo de eventos que é, ia registrando muitos dos nossos momentos como esse abaixo.

arquivo pessoal Luciano Bernardes

O dia começou muito bem com fotaça do lindo chororó-de-manu (Cercomacra manu). Ele não economizou na pose.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Em seguida uma foto de quadro do pica-pau-avermelhado (Dryobates affinis). O Kenny nos deixou inspirado ao nos mostrar tanta lindeza.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

papa-formiga-barrado (Cymbilaimus lineatus) compareceu e pediu para fotografarmos ele. Chegou bem pertinho da gente. Seu "zoião" vermelho se destacava na floresta. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

O encantador periquito-santo-de-bico-escuro (Forpus sclateri) ficou com ciúmes e posou também. Jogou até "beijinho no ombro".

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas quem roubou a cena foi a majestosa tiriba-de-deville (Pyrrhura lucianii). Não, o nome científico não foi homenagem ao Luciano Bernardes, mas ele ficou muito feliz em registrá-la. Disso eu tenho certeza! 🤣🤣🤣

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Esse é o urubuzinho (Chelidoptera tenebrosa), que de urubu não tem nada. Ele me olhou e disse: tia, tia, me fotografa, não faz como todo mundo que me ignora, por favor. - Desejo atendido com foto de quadro.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas foi essa menina com sua "sainha" de babados, pronta para ir para o baile, que nos deixou extasiados. 

A mãe-de-taoca-de-cauda-barrada (Oneillornis salvini) não era novidade para mim, mas foi um prazer fotografar essa belezura novamente.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Acho que fiquei mal acostumada nesse dia de tanto fazer foto bonita. Mas não podia faltar o momento-frustração

Isso se deu com uma borralhara-ondulada (Frederickena unduliger). Eu tenho registro dela, feito em 2019. Nem era novidade, mas a gente sempre gosta de melhorar a foto de uma espécie. 

Eu só lembrava o tanto que ela gostava de dificultar. Era um drible e um esforço danado pra poder fazer uma fotinho razoável. E não foi diferente com esta. 

Depois de tentar de tudo, só Luciano, que se entranhou na brenha, conseguiu fotão dela e o Gustavo conseguiu registrar a fêmea. 

Eu consegui também, só que um baita borrão, impostável. Veja abaixo a minha foto e depois a do Luciano.🙃❌🍀☘️

minha melhor foto da espécie no dia
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

a Foto do Luciano
arquivo pessoal Luciano Bernardes

Mas para compensar, o Luciano, que tem paixão por borboletas como eu, me chamou para ver essa encantadora Helicopis cupido, uma das mais lindas que já vi. Uma verdadeira obra de arte da mãe-natureza. Quase surtei de felicidade com esse "borbolifer".

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Em seguida, enquanto caminhava, fiz muitos outros bichinhos legais, fazendo com que eu esquecesse as terríveis dores nos pés. Resultado? Fiquei com vontade de passar cinco dias, no mínimo, no seu Lula. 

Até os insetos eram maravilhosos. E o melhor, tinha cafezinho e conversa jogada fora. Do jeitinho que gosto.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

E assim nossa manhã "voou" de tantos bichos ao nosso redor. Já relaxada, lá estava eu dando colo para os amigos e rindo à toa.

Eu estava em alta fase Trekker e como setembro (dia 08) é o mês que se comemora o Star Trek Day, toda hora que eu posava pra foto, eu fazia o Live long and prosper (vida longa e próspera) gesto que marcou o Vulcano Mr. Spock.🖖

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Voltamos para a cidade onde Kenny nos levou num restaurante muito especial para almoçar:  o Cuzco Restaurante. Eles servem uma culinária peruana e regional pra ninguém botar defeito. Além da deliciosa comida, regada a uma geladinha, pudemos registrar uns bichinhos bonitinhos na varanda que dá para o rio Madeira. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Apesar da visão do rio Madeira estar prejudicada pela fumaça, a vegetação ali às margens estava intacta e tinha muito passarinho legal.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Veja no quadro abaixo algumas das espécies que fizemos no Cuzco Restaurante: 

1 - ferreirinho-estriado (Todirostrum maculatum)
2 - sanhaço-da-amazônia (Thraupis episcopus)  
3 - joãozinho (Furnarius minor)
4 - pardal (Passer domesticus)

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Na parte da tarde demos um pulinho na linha C30 de novo e novamente rendeu bem. O lugar é muito massa.

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Abaixo uma sequência com algumas espécies do local:

1 - andorinha-azul (Progne subis)
2 - araçari-mulato (Pteroglossus beauharnaisii)
3 - arapaçu-barrado-do-juruá (Dendrocolaptes juruanus)
4 - arapaçu-galinha-ocidental (Dendrexetastes devillei)
5 - ariramba-da-capoeira (Galbula cyanescens)
6 - cancão-da-campina (Cyanocorax hafferi)
7 - caraxué-da-várzea (Turdus ignobilis)
8 - gavião-preto (Buteogallus urubitinga)
9 - urubu-da-mata (Cathartes melambrotus)

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas o destaque da tarde para mim foram os dois primatas fofíssimos que cruzaram nosso caminho. Eles sempre conseguem me hipnotizar com seus jeitinhos carregados de trejeitos. 

Abaixo o Macaco-Prego-Castanho (Sapajus apella).

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

E aqui o fofíssimo Mão-de-Ouro (Saimiri ustus). 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

O dia já estava começando a se despedir. Esperamos escurecer um pouco mais e partimos pra tentar uma nova ave. Desta vez, apesar de ser uma ave de hábitos noturnos não era uma coruja.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

E teve história, da boa. Eu no meu limite de cansaço físico e mental, mas do tipo que não arreda pé numa passarinhada, lá estou eu atrás de uma ave rara, com poucas fotos tanto no e-Bird como no Wikiaves: o uru-de-topete (Odontophorus stellatus).

A gente chegou num provável local onde ele poderia ser avistado, estávamos andando na estrada e ouvimos o bando vocalizando. 

Um deles passou correndo, mas só Luciano conseguiu uma foto do fantasminha. Falo isso porque ele costuma ser mais ouvido do que visto, e pior ainda, registro por foto é quase um milagre.

Kenny, com toda sua excelência e experiência, nos disse, vocês ficam aqui, e vou entrar ver se acho algum empoleirado. Pensa num momento de pura expectativa e tensão. Igual encontro com crush pela primeira vez. 🙈🙉🙊

De repente ele retorna e pede para o seguirmos em silêncio absoluto. Fomos pé ante pé, tentando não encostar nos galhos - coisa quase impossível numa mata fechada de pouca visibilidade, principalmente à noite. 

Só que ao chegar no lugar, o uru tinha não estava mais. Olhamos tudo ao nosso redor e nada. Suspira, respira, inspira e se resigna. Mas o Kenny não é de desistir e continuou procurando ao redor e ... 

Pimba! 🎯

Lá estava o "moçoilo" no alto de outro galho, todo empoleiradinho. Um pouquinho de iluminação e dá-lhe clique até o braço doer. Não dava pra se mexer muito, pois era um morrinho e a gente estava no alto dele, um passo em falso e a gente despencaria lá de cima. Uma vala enorme nos separava do ponto onde ele estava. 

E ainda tive que posar pro filme. Meus queridos amigos queriam me registrar fotografando ele. Afinal eles estavam sobrelotados de aves novas feitas nos dois primeiros dias e essa era a minha primeira na P2.  


Apesar do terreno não ser muito amigável, vai de lá, vai de cá, se entorta, se apruma, se abaixa, se ajeita, acabei conseguindo uma foto bacana dessa preciosa ave. Depois foi só comemorar.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

3º Dia – 04/09 - quarta-feira


Uma das coisas que Gustavo e Luciano mais tinham expectativa era tentar ver a coruja-de-crista que eu tinha feito no PARNA Mapinguari poucos dias antes com o Kenny durante o dia. 

Reservamos este terceiro dia para ir em busca dela e de outras preciosidades do Parque.

Saímos muito cedo de Porto Velho e uma nova aventura começou, anda aqui, olha dali, entra numa trilha, entra em outra, tudo dentro do Parque e no seu entorno. 

a gente chegando
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Depois paramos para um cafezinho. Só que não foi em padaria não, nem na sede do parque como da outra vez. Descobrimos mais um talento do Kenny, preparar nosso desjejum no mato.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

A fumaça continuava no ar. Havia fogo em muitos lugares infelizmente. Lembro disso com muita tristeza. Ele havia alcançado não só o entorno do Parque mas um dos lados desde a entrada que dá acesso a ele. 

Acho que o Mapinguari tinha tirado férias e deixado a floresta desprotegida por um tempo (leu sobre ele na P1? Nãooo? Então 👉 clique aqui 👈para ler sobre esse ser mítico.) 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Dava dó ver o desespero das aves na mata queimada, tentando respirar, se alimentar, encontrar suas famílias. Veja esses 4 registros abaixo para entender um pouco a situação.

Ouvi a tesourinha resmungando isso: - Vai-se daqui senhora humana, a sua espécie é cruel e imperdoável, olha só o que ela fez com a minha casa.

tesourinha  (Tyrannus savana)
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Assim disse o suiriri-de-garganta-branca quando passei por ele: - Ei humana, porque você não queima sua casa ao invés da minha?

suiriri-de-garganta-branca (Tyrannus albogularis)
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

freirinha, quase sem fôlego, conseguiu balbuciar: - Estou procurando água para beber, ar para respirar e comida, minha senhora! Sua raça queimou tudo por aqui. Vai se embora, antes que queime junto também!

freirinha (Arundinicola leucocephala)
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

E aqui um "diálogo" entre eu e o papa-moscas-do-campo neste dia. Ele estava revoltado e se expressou com ódio por nós humanos porque destruímos seu habitat. 

Eu então lhe disse: perdoa-me senhor papa-moscas, eu sou contra tudo isso que está acontecendo. Não esperava tanta barbaridade! Não aguento mais respirar essa fumaça que a minha raça provocou na sua casa. Um dia esses criminosos vão pagar por isso, vão ficar sem ar, sem água e sem casa para morar. Eles estão comprometendo o futuro dos próprios filhos e netos. 

papa-moscas-do-campo (Culicivora caudacuta) 
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas vamos falar de coisas boas. Mesmo com toda essa destruição, conseguimos ver algumas espécies bacanas um pouco mais adiante, na parte não atingida pelo fogo. 

1 - caboclinho-de-papo-escuro (Sporophila ruficollis) 
2 - coleirinho (Sporophila caerulescens)
3 - freirinha (Arundinicola leucocephala) 
4 - canário-do-campo (Emberizoides herbicola) 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas nossa sorte começou a mudar mesmo quando adentramos as trilhas. Kenny conseguiu nos mostrar uma lindíssima "regina" ou melhor, uma mãe-de-taoca-cabeçuda (Rhegmatorhina melanosticta). 

Esse apelido de "regina" tem a ver com uma expedição que fiz com o amigo Ricardo Plácido para o Acre em 2019, onde ele e nossos amigos só falavam os nomes científicos das aves que a gente avistava. Rhegmatorhina soava como regina para os meus ouvidos.

Não era novidade para mim, mas era para o Gustavo e Luciano. A felicidade deles foi a minha. Mesmo assim fazer esse registro foi tão emocionante quanto da primeira vez. Vá ser bonita assim noutro planeta. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Ainda rolou uma difícil choquinha-do-madeira (Epinecrophylla amazonica) e um arapaçu-bico-de-cunha (Glyphorynchus spirurus. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Já perto da hora do almoço, dentro de uma trilha, Kenny pediu que parássemos e fizéssemos silêncio absoluto. Eu já conheço esse estilo do Kenny falar. Pode esperar, tem coisa boa no pedaço. Essa é uma daquelas horas que você paralisa, sequer respira, pois sabe que tem bicho difícil por perto.

De repente uma muvuca na floresta. Sim, você já viu jacamins vocalizarem? Se nunca ouviu 👉 clique aqui.👈  Eles quase sempre andam em bando, um líder vai na frente orientando e protegendo o resto do bando. E eles fazem uma zueira, um vem e vai, como se fossem um bando de crianças desgarradas.

Um bando de oito jacamim-de-costas-brancas (Psophia leucoptera) estava cruzou o nosso caminho.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Detalhe, todos nós sentamos no chão, sem se mexer muito, só buscando ângulos sem folhas intrometidas ou galhinhos metidos na frente. 

E foi assim que ganhei meu segundo lifer nessa segunda parte da viagem. E com foto de quadro, que hoje enfeita minha parede aqui do escritório.  

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Bom, a fome e o cansaço estavam me deixando aparvalhada e confusa. Achei que estava vendo até o Mapinguari em cima de uma árvore. Ops! 👀

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Era só a cauda de um primata que saiu em disparada quando nos viu. O olhinho e a boca fui eu que delineei no photoshop. 🧐😕😂😂😂

E lá fomos nós para a cozinha. Eba, eba! Olhe abaixo a nossa cozinha e o cozinheiro. Tinha até ajudante. O Kenny consegue sempre me surpreender. 

Almoço com direito a pão com ovo, o salvador do mundo.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Gustavo e eu nos acabamos de comer. Depois tiramos aquela sonequinha, o famoso  "sono da beleza", assim nomeado pelo pessoal do CEO - Centro de Estudos Ornitológicos. 💤😴😁🥴

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Após o merecido descanso, eu e Luciano fomos para um lado e Gustavo e Kenny para outro. Aí fizemos boas e tranquilas fotos de um casal de papa-moscas-do-campo (Culicivora caudacuta) e da sanã-carijó (Mustelirallus albicollis), que veio matar a sede na única fonte de água por perto, para ver se aliviava o calor do fogo.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

E apesar do cenário depressivo, como esse embaixo em alguns lugares do Parque, nosso dia foi muito produtivo. 

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Fomos tentar a sorte no Ramal das Campinas de Humaitá, ali mesmo em Canutama, embora o ramal leve o nome da cidade vizinha. 

Estava um calor infernal. Luciano fez esse registro dos dois amigos se abanando com os bonés. Ainda bem que eu tinha meu lequinho.

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Encontramos poucas aves. Vimos apenas um pula-pula-de-cauda-avermelhada (Myiothlypis fulvicauda) e um tiziu (Volatinia jacarina). Mas pelo menos isso trouxe um pouco de movimento para nossas câmeras.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Já nos preparando para retornar à cidade, uma tesourinha (Tyrannus savana) pousou num fio e abanou seu rabão para se despedir da gente. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

A gente precisava arrumar nossas coisas pois o dia seguinte seria de muita estrada. Íamos sair cedo de Porto Velho/RO e ir até Rio Branco/AC. 

4º Dia – 05/09 - quinta-feira


Saímos cedo. A ideia era ir passarinhando sem compromisso pelo caminho. No Trip Report, cujo link vou deixar aqui no final, tem a lista de cada uma das nossas paradas.

A ideia era fazer bolinha vermelha no mapinha do Wikiaves (esse nome foi inventado por mim: red-ball-lifer) em cada município. O que significa isso? Registrar alguma ave ou mais de uma em cada município do caminho. É uma brincadeira divertida, proporciona uma gostosa distração e também é sinônimo de colaboração ou ciência cidadã.

print do meu perfil no Wikiaves

Mas já adianto que a parada mais gostosa foi a feita no distrito de Abunã, onde o Rio Madeira divide o Brasil com a Bolívia. Almoçamos no Peixe Frito do Seu Menino, um lugar pra lá de bom e barato.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Começamos nossa passarinhada na Base de Selva PM. Quase deu fotão do formigueiro-de-cara-preta (Myrmoborus myotherinus), mas sempre tem um galhinho que teima em não sair da frente. 😆🌿

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas o rapazinho-estriado-de-rondônia (Nystalus striolatus) facilitou, só o céu branco no fundo que não ficou legal. Muitos me falaram coloca a foto numa IA pra criar um fundo. Aviso aos navegantes, jamais! Meus olhos e meu talento pessoal são muito preciosos para mim.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

No Distrito de  Jaci Paraná, Porto Velho, rolou uma linda e charmosa cigarrinha-do-campo (Ammodramus aurifrons). Ela parece prima do querido pardal. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Em Labrea/AM, às margens da BR-364, conseguimos aumentar o número de espécies. 

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Foram muitas aves legais, com destaque para o caçula (Myiornis ecaudatus), um dos menores pássaros do mundo. Delícia também ver bandos de maracanã-guaçu (Ara severus).

Tinha até bandinho misto com destaque para a saíra-de-bando (Tangara mexicana) e o lindo sanhaço-da-amazônia (Thraupis episcopus).

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

E falando em pardal (Passer domesticus), olha ele aí em Acrelândia/AC.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

E de novo a "priminha do pardal" marcou ponto comigo, foi em Plácido de Castro/AC. Pousada num galhinho, a simpática cigarrinha-do-campo (Ammodramus aurifrons) compareceu para virar meu pontinho vermelho. E ainda me deu aquela encarada.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Já em Senador Guiomard/AC um senhor pomposo, todo elegante e bem vestido, ficou paradinho para a foto: Obrigada senhor urubu-preto (Coragyps atratus). O senhor é puro charme e faz um trabalho de limpeza honroso nas nossas matas e estradas de causar inveja aos donos da Ecourbis e Loga, aqui de São Paulo.
 
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Finalmente chegamos à Rio Branco/AC. Já quase escurecendo, demos uma passadinha no Ramal do Gurgel. Lindas ciganas (Opisthocomus hoazin) iluminaram o nosso final de tarde e amenizaram um pouco do cansaço. Só não quiseram ler a minha sorte!😂😂😂
 
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Nós ficamos hospedados no Pousada Jardins GuestHouse, um lugar incrível, muito agradável. Rosiany, a proprietária, tratou a gente como se fôssemos da família. Link da pousada 👉aqui👈.

Abaixo fotos da Pousada feitas pelo Luciano Bernardes. No fundo e nas laterais tem belos jardins, uma piscina e um barzinho. E dentro tem uma lojinha, que é um deleite para os olhos e um desespero para a carteira. 🤣🤣🤣

arquivo pessoal Luciano Bernardes

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Como eu estava com os pés muito inchados e doloridos, Rosi conseguiu ajeitar um quarto no andar térreo, para que eu não precisasse subir e descer as escadas nos próximos dias. 

Falando  neles, eles só pensavam em futebol, pois viraram duas bolas. 🦶⚽⚽🦶

Minha bota, dois números maiores, não conseguia calçá-los. Mas depois de uma boa noite de sono, eles sempre melhoravam um pouco.

Desconfiando que fosse problema circulatório por causa do calor e fumaça, contratei logo uma deliciosa massagem na pousada, o que fez um bem danado para meu corpo e minha mente.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

5º Dia – 06/09 - sexta-feira


Logo cedo, depois do café da manhã, buscamos o Ricardo Plácido (@ricardo__placido) na casa dele e lá fomos nós para o famoso Ramal do Noca, um dos principais hotspots de Rio Branco e depois seguimos em frente até a Roça do Assis

Nosso amigo e guia Ricardo Plácido conhece bem essa área, é quase um quintal de casa para ele. Novamente nos deparamos com muita mata queimada e fumaça.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Teve momentos que eu nem conseguia calçar as botas e no desespero para pular do carro e fotografar, descia do carro de meia-sapatilha. E o Kenny registrou, acho que para me perguntar, depois, onde eu comprei, para adquirir alguns pares para as filhas dele. 😆😆😆

arquivo pessoal Kenny Uéslei

Mas mesmo assim em alguns pontos conseguimos fotos muito bonitas de algumas espécies icônicas.  Clicar aves como a marianinha-amarela (apsiempis flaveola) e agulha-de-garganta-branca (Brachygalba albogularis) é sempre muito bom.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas o destaque mesmo foi para o bando de maracanã-de-cabeça-azul (Primolius couloni), que mesmo um pouco longe da gente, deu foto muito bonita. Seus olhos claros se destacavam.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas quando a gente olha no chão e vê algo brilhar feito ouro, logo a curiosidade é aguçada, principalmente quando as pepitas se mexem. Mas nem tudo que reluz é ouro. 🤣🐜🌟

Ah! Era só um bando de Eciton rapax, membro da tribo de Formigas de Correição. Opa, isso significa que pode ter ave legal nas redondezas. Talvez uma mãe-de-taoca.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas o que descobrimos em seguida, não foi ouro, nem ave difícil. Demos de cara com uma trilha recém aberta ilegalmente, de acordo com Ricardo, por um trator, que ficou estacionado, sozinho, onde não vimos ninguém, mas a destruição da floresta de taboca já estava bem adiantada.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Eu confesso que estava perto do meu limite, não tinha vontade de andar pois minhas pernas, pés, braços e cabeça doíam muito. Eu ficava quase o tempo todo sentada num toco ou no meu banquinho. 

Mas saia em disparada, apesar das dores, quando alguém me chamava dizendo que havia alguma ave bacana por perto como foi o caso do tucaninho-de-nariz-amarelo (Aulacorhynchus atrogularis).

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Ou mesmo com o fofo bico-chato-de-cara-verde (Tolmomyias viridiceps), que já foi dividido no e-Bird (Clements) e é future-lifer pra mim no Wikiaves (CBRO 2021), onde ainda é chamado de bico-chato-amarelo (Tolmomyias flaviventris).

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Outro bonitão que surgiu foi o colorido capitão-de-bigode-limão (Eubucco richardsoni). É muito charme para um sujeitinho só. 🤣🤣🤣

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

A rotina passarinheira, que sempre amei, estava começando a me deixar esgotada. Eu estava muito preocupada. Minha saúde, meu humor e minha companhia não estavam em seus melhores dias. Por estar super lenta para andar, eu ficava sempre para trás, e penso que isso atrapalhou um pouco os meninos.

Uma expedição como esta não acontece todo dia, por isso eu queria aproveitar cada instante ao máximo, mas não estava conseguindo.

Às vezes eles também se cansavam e se sentavam perto de mim, como o Luciano e o Ricardo na foto abaixo, mas lá no fundão, do lado da orelha do Ricardo aparecem o Gustavo e o Kenny tentando sei lá qual ave. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Em alguns momentos dividimos as equipes, uma hora eu permanecia sob o comando do Ricardo, outrora do Kenny, pois isso possibilitava Luciano e Gustavo buscarem mais aves com mais rapidez e tranquilidade do que se eu estivesse junto. 

Depois fizemos uma paradinha no Boiadeiros Restaurante na rodovia AC090 para comer e tomar uma cerveja geladinha. Muito bom o lugar.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

De lá fomos para um ponto sugerido pelo Ricardo, era perto, do outro lado da rodovia, mas já em outro município, chamado Bujari.

Fomos recebidos por um elegante senhor careca de cabeça bem vermelha, a quem eu admiro muito. Obrigada pela recepção senhor urubu-de-cabeça-vermelha (ruficollis). O senhor é muito bonito.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Entramos na matinha e assim que chegamos, os meninos foram montar um "blind" para tentar uma ave que eu tinha feito em 2014 no Acre e a foto era muito ruim. Sentei num cantinho e fiquei aguardando um tempo.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Quando começaram a clicar até dizer chega, Ricardo me chamou e lá fui eu, meio capenga. Desta vez o picapauzinho-vermelho (Picumnus rufiventris) não decepcionou, me proporcionando foto muito bonita.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

E ao retornar ao carro uma maitaca-de-cabeça-azul (Pionus menstruus) envergonhada deu um "oizinho" para a gente . 

Eu assino embaixo da adoração que a Claudinha Brasileiro e a Agnes Coenen (The crazy Parrotlady) têm pelos psitacídeos. Eles são fascinantes. Mas e somente se vistos em seus habitats natural. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Já na pousada, no começo da noite, escuto o Kenny nos chamar: peguem as câmeras e corram aqui. Nem banho eu tinha tomado ainda mas não pensei duas vezes. 

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Do outro lado do muro da Pousada, numa matinha bem fechada, uma linda coruja-orelhuda (Asio clamator) deu o ar da graça.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Um pouco tempo depois quem nos chama de novo? Não, não foi o Kenny não, foi um urutau-grande (Nyctibius grandis), com seu grito fantasmagórico e assustador, embora seja uma ave pacífica e de olhar meigo. Nunca ouviu um? Então 👉 clique aqui 👈.

arquivo pessoal Luciano Bernardes

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares


6º Dia – 07/09 - sábado


Mais um dia acordando cedo e indo para o Ramal do Noca. Começamos fazendo a foto do grupo logo que chegamos. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Kenny Uéslei

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Kenny e Ricardo sempre atrás de aves difíceis. E foi nas bordas de um tabocal que consegui registrar o charme da linda freirinha-de-coroa-castanha (Nonnula ruficapilla).

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Seguimos em frente e resolvemos parar e entrar onde o trator abrira a trilha clandestina, que apelidamos de Trilha do Trator. 

Mais uma vez um primata conquistou minha atenção. O Sagui-de-Bigode-Imperador (Saguinus imperator ssp. imperator) veio nos espiar, talvez nos contar que o trator destruidor de florestas tinha deixado o local.

Diz o Wikipedia que esta espécie de sagui do gênero Saguinus foi assim nomeado em homenagem ao imperador Guilherme II da Alemanha, mas penso que foi nomeado em homenagem ao meu amigo Ricardo Plácido, o imperador das aves do Acre.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Sim, o trator não estava no local do dia anterior e a trilha aberta por ele seguia em frente. Era uma trilha não autorizada, em busca de alguns troncos para uso em fazendas, de acordo com Ricardo.

Dava muita tristeza ver a mata ao lado de um filete de água sendo suprimida. Já não bastava a fumaceira empesteando o ar por conta das queimadas em muitos pontos do Brasil. 

Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) revelam que 278.299 focos de incêndios florestais foram contabilizados no Brasil em 2024. 

E assim caminha a humanidade, depois fica procurando explicações para os "desastres naturais" consequente dessas destruições sem precedentes.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Almoçamos no mesmo lugar do dia anterior, o Boiadeiros Restaurante, e os proprietários, um casal muito simpático, sentou para conversar comigo e fez questão que fizéssemos uma foto juntos.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Depois do almoço seguimos para a APA Lago do Amapá e Ramal do Gurgel, dois hotspot muito interessantes de Rio Branco.

Uma das aves que os meninos mais queriam encontrar era a ariramba-castanha (Galbalcyrhynchus purusianus). Vai daqui, vai dali, e finalmente encontramos. Ela é muito emblemática e desejada por todos os observadores de aves que chegam no Acre. Eu a vi de longe em 2014 na minha primeira vez no Acre.

Ela recebia outro nome naquela época. Foi no Rio Purus e a chamei de "cereja do bolo" e um carnaval para os olhos. Na época seu nome era Sovela-vermelha

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

E na foto abaixo a gente comemorando o encontro com ela. Realmente um carnaval para os olhos.

arquivo pessoal Luciano Bernardes

E rolou mais algumas aves legais nesses dois pontos. Olha só o quadro abaixo:

1 - agulha-de-garganta-branca (Brachygalba albogularis) 
2 - maracanã-de-cabeça-azul (Primolius couloni)
3 - picapauzinho-de-barras-finas (Picumnus subtilis)  
4 - caraxué-da-várzea (Turdus  debilis)

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

7º Dia – 08/09 - domingo


Começamos pelo Ramal do Noca, tentando uma das poucas aves novas da minha life-list no Acre o barranqueiro-escuro (Automolus melanopezus). 

Esse danado quase me matou de raiva, cantou, cantou até dizer chega na borda do tabocal, mas não se dignou a mostrar nem a pontinha do bico, embora o Ricardo que estava comigo na hora, tentou de tudo. Eu fiz só gravar o som dele.

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Seguimos para a Roça do Assis, mas quando a saúde não está boa, o humor decresce e toda a energia que nos cerca vai embora. Sem energia boa ao redor, me parece que as aves deixam de se aproximar.

Achamos um bando misto de "colorídeos", que fez a alegria dos meninos, pois tinha alguns lifers para eles, mas eu não consegui fotos legais, eles estavam muito altos e eu quase sem forças. 

Só consegui fazer algumas fotinhas meia bocas de alguns como: pipira-de-máscara (Ramphocelus nigrogularis), cancão (Ibycter americanus), uirapuru-de-garganta-preta (Thamnomanes ardesiacus) e chororó-negro-do-acre (Cercomacroides fuscicauda). 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Almoçamos no Boiadeiros de novo. Eu estava tão confusa e cansada que fiz selfie da gente no almoço, mas nem me dei conta que não estava aparecendo na foto.
 
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Na parte da tarde eu tomei uma decisão drástica, iria ficar dentro do carro e não iria entrar nas trilhas com o pessoal. Precisava ficar com os pés para cima e descansar um pouco. Com isso eu deixaria de atrasar os meninos nas caminhadas. 

Eles decidiram adentrar a Trilha do Trator e ver até aonde ela ia. O carro ficou parado na entrada, e eu baixei o banco da frente, coloquei os pés para cima por um tempo, depois apaguei. O Luciano até me registrou dormindo quando voltou no carro buscar alguma coisa.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares e Luciano Bernardes

Acordei com vontade de fazer necessidades. Culpa da cerveja do almoço. 😁😁😁 Desci do carro, olhei ao redor vendo onde eu poderia ter privacidade. 

Nisso vinham dois motoqueiros andando bem devagar. Eu fiquei apavorada com o jeito que ficaram olhando pra mim, peguei minha câmera, meu banquinho, tranquei o carro e entrei na trilha. 

Fui andando para ver se via algum sinal dos quatro meninos, mas nada. De repente, vejo Ricardo vindo  correndo feito doido e fiquei imaginando o pior. 

Que nada, ele veio me buscar porque um precioso lifer para todos nós tinha finalmente dado o ar da graça e Gustavo e Luciano tinham feito fotão.

Ele me pegou pela mão e saiu correndo me arrastando em direção ao ponto, lá no fundão. Cheguei lá nas últimas, o danado, um "primo" do demoníaco Synallaxis, ainda estava por perto sendo monitorado pelo Kenny. 

Tentamos atraí-lo, mas ele não queria muita conversa. Depois de uma agonia que parecia não ter fim, eu consegui um borro-lifer, pelo menos postável, do birrento senhor limpa-folha-de-bico-virado (Syndactyla ucayalae). 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

A adrenalina e a tensão fizeram minha alma retornar ao corpo. Voltamos todos felizes para o carro e tivemos uma surpresinha. Até hoje não sabemos qual foi a intenção da pessoa que fez o que encontramos escrito no nosso vidro traseiro todo empoeirado. 

Depois de muito confabular deixamos isso pra lá e voltamos para a cidade. 

Paramos na Altaneira Cervejaria / Jupará Choperia, onde eu comemorei duas coisas. O registro do limpa-folha-de-bico-virado (Syndactyla ucayalae) e o Star Trek Day, comemorado anualmente dia 8 de setembro, em homenagem à primeira transmissão da série original de Star Trek (Jornada nas Estrelas) nesse mesmo dia em 1966. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

8º Dia – 09/09 - segunda-feira


Fomos direto para a Trilha do Trator. Eu estava tão mal de saúde, que sequer conseguia fotografar direito, nada focava, eu mal via o vulto das aves na floresta.

Se eu tivesse juízo, teria ficado na pousada, mas o espírito da floresta que me habita emitiu um chamado interno e eu não resisti. 

Fui premiada logo na chegada com uma família de Quati-de-Cauda-Anelada (Nasua nasuatomando) tomando água na pocinha bem do lado. Um filhotinho mais fofo que o outro.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

O pessoal adentrou as trilhas e eu fiquei no comecinho dela, orientada pelo Kenny a tentar o formigueiro-do-bambu (Myrmoborus lophotes). 

formigueiro-do-bambu (Myrmoborus lophotes) 
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Eu tentava ver os galhos que ele pulava para ver se melhorava a foto, quando ouvi meu nome e o pedido para eu entrar no tabocal lááá no fundo. Era só seguir em frente.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Kenny me esperava no caminho para irmos tentar melhorar o limpa-folha-de-bico-virado (Syndactyla ucayalae).

Fomos andando rápido pelo meio da taboca e de repente eu parei e falei: Kenny, Kenny, olha isso, e apontei ... 👉🐍 uma cobra. 

Se eu tive medo? Nãoooooo depois do Kenny me dizer que ela não era venenosa. Ela era tão fascinante que eu e Kenny ficamos filmando e fotografando ela por uns bons minutos. E ela ficou só nos olhando, desconfiada.

Com a tele
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

com o celular
arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Kenny Uéslei

Depois descobri que era uma serpente conhecida por papa-ovo ou papa-pinto (Drymarchon corais) Serpente não peçonhenta, terrícola e de hábitos diurnos, alcançando até 3 metros de comprimento total. Alimenta-se de anfíbios, lagartos, aves, roedores e outras serpentes.

Dez minutos depois eu e Kenny pudemos registrar o limpa-folha-de-bico-virado (Syndactyla ucayalae) em seu território bem ali do ladinho. 

Como sempre ele não facilitou no início. Um galhinho na frente, uma folhinha, mas, no fim, como diz a moçada hoje em dia, "deu bom".

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

E ainda fiz mais um "borbolifer", uma Zaretis isidora, que sabe se disfarçar como ninguém.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Voltamos para a Pousada e eu resolvi tomar um banho de piscina e relaxar um pouco. Cadê a cerveja, Luciano e Gustavo? Anda logo, pô!

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Um pouco antes de dar nossa última passarinhada fizemos a foto oficial na escada da Pousada. 

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

No final da tarde fomos ao Parque Zoobotânico na UFAC. Começamos bem, registrando um lindo primata, o Saguinus weddelli ssp. weddelli.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Três "carpinteiros" marcaram presença. Eram eles, conforme sequência do quadro abaixo, o pica-pau-pequeno (Dryobates passerinus), o pica-pau-de-peito-pontilhado (Colaptes punctigula) e o pica-pau-lindo (Celeus spectabilis), este último, lindo, raro e temperamental.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Terminamos o dia no Restaurante Água na Boca com a amiga Luana Alencar, grande ornito-bióloga, confraternizando com a gente. Foi uma noite de muito bate-papo, onde encerramos com chave de ouro nossa Expedição.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

arquivo pessoal Kenny Uéslei.


9º Dia – 10/09 – terça-feira


Dia de voltar para casa. Um pardalzinho veio dar tchau pra mim no aeroporto pouco antes de eu embarcar. Registrei com o celular.

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

O voo de volta para casa foi bastante tranquilo, mas eu cheguei em casa super dolorida. Meus pés triplicaram o inchaço durante o voo. Imediatamente agendei médicos e exames, antecipando meu check-up anual previsto para janeiro/2025. 

O resultado foi apavorante só por um motivo: eu necessitaria tomar injeções para repor algumas substâncias que meu corpo perdera, além de precisar de muito repouso e parada das atividades, leia-se viagens. 💉💊

Eu ouvi um "para tudo" dos meus médicos. E mais, só tira meia de compressão para tomar banho e dormir. 

Quando contei para o Luciano o meu pavor por injeções, ele morreu de rir. Ele já foi farmacêutico um dia e disse que adorava injeções, ou melhor aplicar injeções nos outros. 😵‍💫😵😂

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Mas vamos aos finalmentes. Os incêndios florestais e queimadas criminosas produziram grandes estragos no Brasil, pior que isso, uma quantidade absurda de monóxido de carbono (CO) foi lançado na atmosfera e se espalhou por grandes áreas do país.

Segundo o instituto MetSul em matéria do dia 16 de set. de 2024, o nível de monóxido de carbono (CO) se encontrava bastante elevado na faixa que ia do Paraná ao Amazonas naquele período. Exatamente o período que eu estava na região amazônica.

Eu havia sofrido uma exposição prolongada ao monóxido, o que fez o transporte de oxigênio para os tecidos do corpo ser prejudicado, só lembrando que eu sou portadora de cardiopatia grave e meus tempos de mocinha e atleta já passaram há muito tempo. 😂❤️‍🩹👧

O que isso quer dizer? Que o CO causou muita coisa ruim no meu organismo. Foi uma intoxicação considerada moderada pelos médicos. Se fosse grave eu não estaria aqui para contar essa história. Tinha jeito de uma forte enxaqueca, só que não. Era um mal estar geral.

Ele causou um pouco de tudo que é previsto pelos estudos médicos: dor de cabeça e no corpo, fraqueza e muito cansaço, ânsia de vômito e náuseas, tontura, sonolência, falta de coordenação, respiração acelerada, aumento da arritmia, visão borrosa, confusão mental e sei lá mais o que. 

Isso resultou no início de uma depressão nervosa e o pior, meu coração sofreu uma aceleração fora do normal (pena que não foi por amor 🥴😁😆😅🥰). Houve um aumento do risco de AVC e IM muito grande. 

Só não previu que eu ia ficar tão chata durante a viagem. Nem eu estava me aguentando, imagina os meninos. 😈😹🙈

Já viu passarinheira que se preze dormir no carro durante uma passarinhada ? Pois é, lembram dessa foto do Luciano me flagrando dormindo no carro em pleno dia e ramal do Noca?

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Demorou mas quase estou normal de novo. Se eu continuo chata não sei, mas meu bom humor voltou, mesmo sabendo de notícias ruins pelo mundo todos os dias. 🤓🧐😶🤐🤣🤣🤣🤣

A viagem olhando hoje, sete meses depois, foi muito positiva e me ensinou muita coisa. Primeiro: é preciso ficar atenta a condições adversas e se preservar mais. Segundo, não vale, nem pode, ignorar os sinais enviados pelo corpo e mente. E por último, é preciso aprender a aceitar os próprios limites.

Outra coisa que aprendi foi ficar longe da torcida do "tomara que não chova". No norte do nosso país, a época das chuvas torna muitas expedições inviáveis e/ou reduzem seu sucesso. 

Ficamos sujeitos a atolar, suspender passeios como foi em Atalaia do Norte por exemplo (link 👉aqui). Por isso vamos sempre na época da seca, mas agora sei que o risco para a saúde é muito maior. 

Nessa expedição dupla, eu torci feito doida por uma chuvinha que não veio. E você deve estar rindo, pensando que eu não sei o que é a chuva no Acre, ou um barro tabatinga e ou ainda um alagado na altura da coxa, sei sim e muito bem. 😁🙃🫠

Só me resta pedir ao Mapinguari que proteja todos nós, perdoai-nos e livrai-nos do fogo do inferno, provocados pelas almas que não tem piedade nem delas mesmas. Socorrei principalmente as criaturas das florestas que são as que mais foram afetadas.

arquivo pessoal Luciano Bernardes

Apesar das saudades que estou dessa expedição, termino aqui com lágrimas na alma e um poema triste, como um lamento ecoando entre troncos queimados e ninhos desfeitos:

arquivo pessoal Silvia Faustino Linhares

Choro da Mata

Arde a floresta, em silêncio de espanto. Secam as folhas por excessivo pranto.

Choram os galhos, sem folhas, sem flor, onde antes havia apenas perfume e amor.

Fogem os bichos, sem rumo, sem lar. Alguns tropeçam e caem, sem ter onde ficar.

O ninho que ontem era abrigo sereno, hoje é só carvão, silêncio pequeno.

A tesourinha calada no céu cor de cobre, testemunha o lado cruel que o fogo descobre.

E o homem, de olhos tão cheios de cobiça, num segundo, não vê que destrói o seu próprio mundo .

Esquece da sombra, da água e do chão, rasgando a floresta com a sua ambição.

Oh, mata querida, templo da criação, recebe estes meus versos como uma oração.

Que teu verde renasça, no tempo, com fé, como a vida que insiste em brotar sob nossos pés.

Segue o link para o Trip Report na plataforma e-Bird

🍺🐥🦋☕🦉🐦🦖🦕🐍🦎

E apesar de todas as ressalvas que fiz, encerro a postagem dessa longa e vitoriosa viagem deixando para você curtir um vídeo da minha banda preferida, que conheci e aprendi a gostar em minha expedição ao Parque Estadual Chandless - Acre em 2019. Essa música é muito especial e o vídeo é lindo. Só dar play.

The HU - Mother Nature (mãe Natureza) 


Um comentário:

  1. O sanduba do Bartô é booooom demais!
    Que passarinhada! Ainda não conheço o Acre (passarinhando), mas espero realizar esse sonho em breve.
    Que bom que já está recuperada e pronta para mais passarinhadas!

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