Parte 1 - Ilhabela e a Coruja-preta
28 e 29/10/2014
Eu estava
alucinada para fotografar a Coruja-preta
(Strix huhula). Era uma necessidade
ornitológica obsessiva-compulsiva... rs rs rs ... Os prováveis lugares para
encontrá-la eram Brasília, onde já tinha uma viagem programada e Rio Claro/SP
onde o amigo Gustavo Pinto vinha registrando essa maravilhosa espécie. Em
relação à Brasília, o guia Jonatas Rocha havia me antecipado que desde
fevereiro que ela não era avistada.
A notícia
pior foi quando o amigo Gustavo contou que, por ações inadequadas de algumas
pessoas que visitaram o local sem autorização, os dirigentes do Parque em Rio
Claro proibiram a visitação noturna. Fiquei extremamente chateada. Passaram-se
alguns dias e o Gustavo me passou uma mensagem informando sobre o achado do
nosso amigo e guia Demis Bucci em Ilhabela. Ele localizara a Coruja-preta (Strix huhula) naquela localidade. Entrei em contato imediatamente com
ele e programamos a nossa ida para lá.
Lancei o
convite no Quero Passarinhar e dois
amigos, de pronto, responderam interessados. Marcamos de ir na terça-feira
(28/10/14) com volta na quarta. Trabalhei pela manhã, saí depois do almoço e
fui com o Demis, sua esposa Aline e a pequena Sofia encontrar com o resto do
pessoal, os amigos Rosemarí Júlio e Aluisio Ferreira.
Demis, Eu, Aluisio e Rosemarí - by self timer Demis |
Bentevizinho-de-penacho-vermelho (Myiozetetes similis) |
Coruja-preta (Strix huhula) |
Coruja-preta (Strix huhula) |
Repetindo
aqui uma frase citada pelo amigo Jarbas Mattos em seu perfil do Facebook: “A
foto é a caça, é o instinto da caça sem a vontade de matar, é a caça dos anjos.
Perseguimos, miramos, atiramos e clac! Ao invés de um morto, nós fazemos um
eterno. (Chris Marker)”
“Caçar” uma
coruja no escuro, ante a incerteza de sua vinda e sua permanência para registro
é algo que não tem como descrever ... é tão forte, que já me peguei em várias
situações, com os olhos lacrimejantes, lágrimas escorrendo pelo rosto, mãos trêmulas,
suor escorrendo, pernas bambas, coração acelerado (isso sempre)...
Nós três
fizemos algumas fotos dela, mas o Demis não. E sua breve e emocionante aparição
findou-se por aquela noite. Fizemos questão de voltar ao amanhecer para que ele
conseguisse fotografar também. Quatro horas da matina e ela compareceu, sempre majestosa,
mas sempre muito no alto também. E o Demis conseguiu fazer seu sonhado
registro. Ímpar.
Após esse
momento, pegamos uma trilha ao amanhecer e fomos em busca de mais passarinhos. Conseguimos
registrar o Patinho (Platyrinchus mystaceus),Papa-formiga-de-grota
(Myrmeciza squamosa), Cuspidor-de-máscara-preta (Conopophaga melanops), Pica-pau-de-cabeça-amarela (Celeus flavescens) e o Beija-flor-de-fronte-violeta (Thalurania glaucopis).
Para encerrar
a passarinhada, um último lifer: o Vira-folha (Sclerurus scansor).
Vira-folha (Sclerurus scansor) |
Obrigada
Demis Bucci, que tão bem nos guiou, obrigada Rosemarí, minha companheirona de
passarinhadas e Aluisio Ferreira por integrar esse grupo tão alegre e
festivo.
Como eu tinha
que trabalhar, voltamos à pousada a tempo de pegar o delicioso café da manhã e
retornar a São Paulo. Trânsito lento, cheguei por volta de 15:30h e ainda
trabalhei até o início da noite. Caidinha de sono, ainda fui para casa, baixar
as fotos e arrumar as malas para a próxima viagem/passarinhada, cuja partida
estava agendada para a manhã seguinte. Destino: Brasília.
Parte 2 - Brasília e seus passarinhos
30/10/2014 (quinta-feira)
Desde julho
que eu vinha pensando em ir para Brasília, queria rever os grandes amigos que
lá deixei desde 2003, quando me mudei para São Paulo. Assim que surgiu a
oportunidade eu me programei para ir. Queria aproveitar também para ver os
bacuraus de lá e o famoso Tapaculo-de-brasília
(Scytalopus novacapitalis). Reservei
os primeiros dias para reencontrar os amigos. Esses reencontros são fantásticos
e sempre nos reservam muitas alegrias. Um happy-hour ali, um almoço aqui,
um café da tarde acolá e muita conversa jogada fora. Tem coisa melhor que isso?
Aliás, é algo
que vou aproveitar para comentar aqui: Essa foi uma das viagens mais legais do
ano. Primeiro porque pude matar as saudades da minha irmã de coração, a Laurinha.
Também pude matar a saudade da turma de amigos que não via há muito tempo. E
depois porque fiz uma das passarinhadas mais gostosas do ano. Só de ser no DF,
lugar que foi meu lar durante tantos anos, já foi bárbaro.
João e Laura |
Reunião com as amigas Laura, Carla, Líbia e respectivos familiares |
Eu, Laura, Flavinha e família muito querida |
Eu, Haroldo, Silvana e João em pé - David, Marisa, Pedrinho e Ana Paula sentados |
02/11/2014 – (domingo)
Havia combinado
com a amiga Fernanda Fernandex sair passarinhar no domingo (02/11) e na segunda
(03/11), tendo como guia o Jonatas Rocha. A gente tinha alinhavado a
passarinhada pelo facebook, mas faltavam alguns detalhes que só combinamos no
sábado à noite. No domingo a Fernanda me apanhou e encontramos com o Jonatas na
Flona Brasília.
Eu adoro o
cerrado e sua vegetação exuberante. Sempre amei o cerrado mesmo quando nem me imaginava vir a ser uma
observadora de aves. Sua flora e avifauna são riquíssimas. Geralmente a luz
para fotografar é mágica e proporciona um festival de fotos espetaculares.
Fernanda e Jonatas |
Acordamos bem
cedo e seguimos para o mato. O frescor e o aroma da manhã traziam um encanto
sem igual. O corpo e a mente são tomados por um sentimento de tranquilidade x expectativa
impossível de traduzir em palavras.
E lá vamos
nós começarmos a “caça”. Munidas com nossas câmeras e pesadas lentes, lá
estávamos, eu e Fernanda abaixadas atrás de uma moita a espera da nossa
“primeira estrela”... Em poucos minutos o Jonatas colocou na nossa frente a Sanã-castanha (Laterallus viridis). Havia duas, uma era mais exibidinha e ficou
desfilando de um lado para outro. É muito graciosa. Dava alguns passinhos,
parava, nos espiava e atravessava correndo. Foi ganhando confiança e ficando
curiosa e chegou a caminhar de mansinho em nossa direção. Depois corria e se
escondia no meio do mato. Foi muito divertido.
Sanã-castanha (Laterallus viridis) |
Papa-moscas-do-campo (Culicivora caudacuta) |
Papa-moscas-do-campo (Culicivora caudacuta) |
Mais um pouco
e eis que surge um Tucão (Elaenia obscura), desses que eu brinco,
não tem cor de nada e a identificação é fogo. Se não estiver acompanhada de um
bom guia, ou não gravar a vocalização, esquece, nem gaste clique. Mas esse foi
especial. Cantou, se exibiu, se aproximou sem receio da gente. Acho que as aves
da Flona são todas muito amigas do Jonatas. Parecem vir reverenciá-lo quando
ele aparece. Sorte nossa.
Sorte mesmo,
pois não demorou muito tempo, sabe quem o Jonatas nos mostrou? Ele, o
cinzentinho, pequenino, irriquieto, mas tão desejado e esperado. Com vocês a
estrela do cerrado: Tapaculo-de-brasília
(Scytalopus novacapitalis). Para
tranqüilizá-lo, eu e a Fernanda nos sentamos no chão e nos mexemos bem pouco. O
local era bem escuro, quase uma caverna vegetal...eh eh eh , comecei com ISO
2000, mas depois um raio de sol iluminou o palco do bichinho e pude ir
baixando. Ficamos bastante tempo por ali, e o bichinho estava nem aí para a
gente, estava forrageando e de repente cantou, cantou tanto que até o Jonatas
ficou abismado...lógico que isso me custou uns carrapatinhos nos tornozelos..."ossos do ofício" rs rs rs ...
Tapaculo-de-brasília (Scytalopus novacapitalis) |
Tapaculo-de-brasília (Scytalopus novacapitalis) |
Tapaculo-de-brasília (Scytalopus novacapitalis) |
Foi uma manhã
divertidíssima. Paramos para um descanso e aproveitamos para fazer um lanchinho
básico no meio do mato. Após esse pit-stop, seguimos por vários lugares
procurando aves interessantes, mas o ponto alto da nossa passarinhada ainda
estava por vir: os bacuraus. No meio da nada, embrenhada no mato, achei uma toalha rosa e o Jonatas disse: é do Júlio Silveira, ele perdeu quando veio aqui...morremos de rir da toalha rosa e pelo fato de tê-la achado...e assim, vamos colecionando histórias.
Eu, Fernanda e Jonatas |
Jonatas e a toalha do Júlio Silveira |
Porém tínhamos
que esperar escurecer. Enquanto isso, um casal de Sanhaçu-de-fogo (Piranga
flava) nos deixou de queixo caído ...O cerrado é mesmo uma caixinha de
surpresas.
Até a Coruja-buraqueira (Athene cunicularia) mostrou toda sua fotogenia nesse dia. E antes
que as luzes da tarde nos abandonassem, um Chibum
(Elaenia chiriquensis) e um Tico-tico-de-máscara-negra (Coryphaspiza melanotis) me fizeram ficar
saltitante de felicidade. Afinal os dois eram lifers para mim. A luz estava muito ruim, o lusco-fusco não é bom
para fotografar aves. Com flash ou sem ele, é um desafio conseguir uma foto
boa. Mas era o que tinha para o momento.
Coruja-buraqueira (Athene cunicularia) |
Já escuro,
hora de ir atrás dos bacuraus. Porém, um pouco antes, avistamos no alto de uma
árvore um ninho de Acauã (Herpetotheres cachinnans) com filhotes.
Não quisemos assustá-los, então só fizemos umas duas fotos e seguimos nosso
caminho.
O primeiro a
ser localizado foi o Bacurau-de-rabo-maculado
(Hydropsalis maculicauda), de acordo
com o Jonatas, o mais difícil deles. Ele deu baile, foi de um lado para o
outro, fazendo a gente se deslocar muito. De repente o Jonatas localizou seu
poleiro. Fomos chegando com jeitinho, sempre orientadas pelo Jonatas e ficamos
muito pertinho do bichinho, coisa mais fofa do mundo. Foi emoção demais.
Seguimos para
o segundo, num ponto onde o Jonatas disse que era território do Curiango-do-banhado (Hydropsalis anomala). Esse nem teve
graça (brincadeirinha). O Jonatas localizou-o, iluminou e nos aproximamos o tanto que quisemos, sem molestar o bichinho, lógico. Foi
tão fácil e rápido que nem acreditei. Mais um fofinho para a coleção.
Fernanda e eu e o Curiango-do-banhado (Hydropsalis anomala) by Jonatas |
No retorno, o
Jonatas avistou um Bacurau-chintã (Hydropsalis parvula), que também era lifer para mim. Paramos e sob
sua orientação chegamos do ladinho dele. Fizemos uma foto mais linda
do que a outra. Cheguei perto de 22 horas ou mais na casa da minha querida
amiga Laura. Dormi feito anjo.
03/11/2014 – (segunda-feira)
Na manhã
seguinte, seguimos para o Altiplano, um local no Lago Sul muito legal de
passarinhar. Fomos recebidos pelo canto melodioso da Corruíra-do-campo (Cistothorus
platensis), no entanto ela só ficava longe ou na contraluz, mas pelo menos
melhorei o registro do dia anterior.
Em seguida o Tapaculo-de-colarinho (Melanopareia torquata) permitiu que
fizéssemos fotos lindas.
O objetivo
inicial seria o Bacurauzinho (Chordeiles pusillus) e esse não
decepcionou. Sob a luz matinal do topo do morro, ele permitiu uma aproximação
emocionante.
Depois,
descemos o morro e fomos até a parte baixa tentar mais aves. Algumas aves
responderam bem, outras nem tanto. O Chibum
(Elaenia chiriquensis) apareceu e
pudemos, então, fazer fotão dele. Desta vez com luz bem bonita. O Campainha-azul (Porphyrospiza caerulescens), cujo azul encanta só de olhar, deu um
show a parte.
Campainha-azul (Porphyrospiza caerulescens) |
Seguimos para
uma matinha e vimos algumas espécies bacanas. Um Fruxu-do-cerradão (Neopelma
pallescens) chegou tão perto que não cabia no quadro da lente 300 mm e eu
tive que me afastar.
O Estrelinha-preta
(Synallaxis scutata), como todo
synallaxis tem um gênio danado, adora ficar embrenhado. Ele apareceu
rapidamente, sempre se escondendo, mas acabou me dando o gostinho de fazer
foto, somando mais um lifer.
Estrelinha-preta (Synallaxis scutata) |
O
belíssimo Tico-tico-de-bico-amarelo
(Arremon flavirostris) também queria
participar da festa e veio ver o que estava acontecendo. Já estava passando da
hora do almoço e resolvemos voltar. No caminho a Guaracava-de-topete-uniforme (Elaenia
cristata) mostrou sua linda crista para nossas lentes.
Tico-tico-de-bico-amarelo (Arremon flavirostris) |
Guaracava-de-topete-uniforme (Elaenia cristata) |
De repente
num fio, pousadinha, uma Peitica-de-chapéu-preto
(Griseotyrannus aurantioatrocristatus)
– eita nome científico grande - que era lifer
para mim. Nem saí do carro e fiz fotão. Ainda tive que aguentar a Fernanda
zoando comigo. “Como pode alguém que tem
mais de 800 espécies clicadas não ter essa peitica”...uai...acontece...
Na volta do
Altiplano, seguimos para a Praça dos Cristais no Setor Militar Urbano. Existe
um espelho d'água lá, com garças, socós, biguás, savacus e mais legal que isso,
no buritizal ao seu redor, centenas de andorinhões-do-buriti fazem seus ninhos.
Logo na chegada, cliquei duas Marias-faceira (Syrigma sibilatrix) de forma magistral. Ô bichinho bonito. Havia muitas Garças-branca-grande (Ardea
alba), Biguás (Phalacrocorax brasilianus) e um belo Sabiá-do-campo (Mimus saturninus).
Maria-faceira (Syrigma sibilatrix) |
Sabiá-do-campo (Mimus saturninus) |
Ver os Andorinhão-do-buriti (Tachornis squamata) foi muito
interessante. Os andorinhões entravam nos ninhos e saiam feito foguetes. Foi um final de
passarinhada memorável. Com aquela luz de fim de tarde do planalto central. E
Santa Clara não me decepcionou. Chuva? Só depois da passarinhada terminar.
Andorinhão-do-buriti (Tachornis squamata) |
A sinergia do
nosso pequeno grupo, tanto o de Ilhabela, quanto esse de Brasília mostrou como
isso ajuda a atrair as aves. Não basta só um bom guia e um local legal. Lógico
que isso é imprescindível, mas as boas energias ajudam muito na busca e
encontro das aves. Elas parecem sentir que o ambiente não é tenso, é amigável,
sei lá, quem sabe Freud explica lá do além. (risos)
Jonatas, Fernanda e eu |
Jonatas, Fernanda e eu |
O Jonatas
Rocha é um guia muito tranquilo e atencioso, além de muito competente. Eu, ele
e a Fernanda Fernandes passamos dois dias passarinhando e rimos muito das
nossas trapalhadas...Até a próxima!!!
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Lindas imagens... amei esse blog!!!!!!
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